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10/06/2023 às 13:00•2 min de leitura
Um estudo publicado em maio na revista científica PLOS ONE forneceu, pela primeira vez na história, evidências bioarqueológicas sobre o impacto do trabalho infantil na saúde, crescimento e mortalidade de crianças durante a Revolução Industrial na Inglaterra do século XIX.
A análise das ossadas de jovens aprendizes de fábricas localizadas em zonas rurais, feita por cientistas da Universidade de Durham, foram desenterradas por acaso durante uma escavação na vila de Fewston, no distrito de Harrogate de North Yorkshire. Os mais de 150 esqueletos foram encontrados ao lado de uma antiga igreja.
O estudo mostra a face sombria de um período de grande progresso na Grã-Bretanha, no qual a rápida industrialização e novas tecnologias e métodos de produção provocaram um aumento considerável na produção de bens e serviços. O fenômeno teve reflexos importantes no panorama socioeconômico da época.
(Fonte: Edward Gooch Collection/Getty Images)
Da mesma forma que liberais afirmam que "não há almoço grátis", também é impossível pensar em um milagre econômico sem a existência do trabalho mal pago de mulheres e crianças. Isso permitiu com que as manufaturas britânicas fossem competitivas em um mercado cada vez mais globalizado, diz o estudo.
De acordo com os autores, no ano de 1845, 43% dos trabalhadores nas indústrias algodoeiras tinham menos de 18 anos, percentual que era ainda maior em outros setores da economia. Embora esse fato seja largamente descrito em documentos históricos, esta é a primeira vez que se vê mal-estar, desnutrição, infecções e doenças ocupacionais estampados diretamente nos ossos.
Conhecidas como "moinhos de algodão" ou fiações, essas fábricas eram estrategicamente instaladas em regiões rurais onde a matéria-prima — e a mão de obra — eram mais baratas.
Estudo dos dentes mostrou sinais de desnutrição. (Fonte: John Buglass Archeology/Durham University/Reprodução)
O estudo dos esqueletos dos chamados aprendizes da indústria de Fewston, muitos deles enviados de paróquias distantes, "revelaram as condições brutais existentes nas fábricas". Além de deformados, os ossos das crianças eram claramente menores quando comparados aos de outras crianças daquela época, e apresentavam sinais de deficiência vitamínica e doenças respiratórias.
A análise de isótopos de carbono e nitrogênio mostrou aos cientistas que os menores se alimentavam com baixíssimo teor de proteínas, resultando em raquitismo e escorbuto. Falando à BBC, a primeira autora do estudo e professora de Bioarqueologia da Durham, Rebecca Gowland, explica que, "quando uma criança não se alimenta o suficiente, seu corpo prioriza outras funções biológicas, especialmente o cérebro e o sistema imunológico".
Comovida com "as penúrias dessas crianças escritas nos seus ossos", Gowland espera que as conclusões do estudo sirvam para que a história não se repita. "Estas crianças foram desumanizadas e tratadas como ‘o outro’ ao longo da vida, e o mesmo acontece hoje pelo mundo".