Geração Z e a obsessão pela fama a qualquer custo

10/10/2022 às 06:324 min de leitura

Além de uma espécie de vazio existencial, o que motivou Nick Prugo a alinhar seus interesses com Rachel Lee, ambos na época com 17 anos, para cometer uma série de roubos a celebridades e estrelas de Hollywood, em Calabasas, Los Angeles, EUA, foi a necessidade de manter um padrão de vida, para receber validação, se manter interessante ou nutrir aquele jovem desejo irrefreável de pertencer.

Prugo queria pertencer a um certo estilo de vida criado pela indústria bilionária de filmes americanos que, desde o século XX, vendeu sonhos engarrafados para que filas de aspirantes a estrelas se formassem do lado de fora dos estúdios sob o sol quente de Los Angeles.

A influência começou quando grandes nomes, como Shirley Temple, então uma criança de 10 anos, já inspirava mães por todo o país de que seus filhos poderiam chegar ao estrelato algum dia; e Audrey Hepburn desfilava pelas ruas ofertando algo que poucos podiam adquirir: lifestyle. O alto padrão dividiu Los Angeles entre que mora do lado de lá da montanha, e quem está confinado na vida comum do vale.

A gangue formada por Prugo e Lee, chamada pela mídia de Bling Ring, movimentou a vida de Paris Hilton, Orlando Bloom, Audrina Patridge, Lindsay Lohan e Rachel Bilson; vítimas dos jovens que só queriam roupas e itens de luxo para usar e mostrar nas ainda emergentes redes sociais e nos círculos sociais, em meados de 2008.

Mas hoje, com o mundo a um clique da palma da mão, a obsessão dos jovens pela fama se tornou uma meta de vida.

O fator fama

Família Kardashian. (Fonte: GZH/Reprodução)Família Kardashian. (Fonte: GZH/Reprodução)

Existe uma ideia estabelecida de que uma pessoa nasce uma estrela, enquanto celebridades são apenas construídas. Ou seja, pela lógica, qualquer um pode se tornar famoso – sobretudo hoje em dia. A cada instante nasce uma celebridade em alguma rede social por uma situação que gravou, por inventar uma piada, por apenas dançar ou por fazer qualquer coisa, basta que isso viralize.

Nos anos 2000, quando o crescimento dos paparazzi e das revistas de fofocas se tornaram um entretenimento diário que rendia milhares de dólares nos Estados Unidos, produtores de televisão viram a necessidade de criar programas que acompanhassem a vida das pessoas famosas de maneira íntima, registrando da rotina matinal até as discussões. Isso porque as estrelas de Hollywood, de cantores a atores, naquela época habitavam um patamar inalcançável, gerando ainda mais interesse e curiosidade do público, que queria se sentir mais próximo daquela realidade.

Portanto, os produtores passaram a lançar olheiros em baladas e lugares de alto padrão para procurar por rostos bonitos que poderiam oferecer o que os espectadores queriam: mídia. Ter um padrão de vida alto era um diferencial atrativo, mas personalidade e carisma sempre foram a base. Assim nasceram os realities shows, que lançaram de Paris Hilton a família Kardashian para o estrelato.

Desde então, a cultura pela fama gerou uma espécie de obsessão, catapultada pelos benefícios tentadores que os denominados "influenciadores digitais" exibem diariamente para uma audiência compulsiva de milhares de seguidores: itens de luxo, viagens, entradas VIPs, reconhecimento, e até dinheiro – mas também o conforto de uma vida tranquila em relação às adversidades cotidianas.

Rachel Lee e Nick Prugo. (Fonte: CM/Reprodução)Rachel Lee e Nick Prugo. (Fonte: CM/Reprodução)

“Nossos grupos focais mostraram que os jovens aspiram à fama mais do que qualquer outra coisa”, disse Yalda T. Uhls, pesquisadora sênior do Centro de Mídia Digital Infantil da UCLA, à TeenVogue.

Uma pesquisa feita com adolescentes de 14 a 18 anos pelo The Washington Post, da Kaiser Family Foundation e da Universidade de Harvard, mostrou que 31% dos adolescentes norte-americanos passaram da ideia de querer ser famoso a admitir que acham provável que em algum momento sejam famosos. O autor do livro Fame Junkies, o escritor Jake Halpern, relatou que um grupo de garotas entrevistadas por ele disseram preferir ser assistentes de uma pessoa famosa do que CEO de uma grande empresa.

Em seu estudo "Fama e o Eu social: a necessidade de pertencimento, narcisismo e relacionamento predizem o apelo da fama", a psicóloga Dara Greenwod ressalta que o desejo de ser visto/valorizado é o maior apelo da fama entre os jovens, seguido pelo status e a motivação pró-social. Curiosamente, essas motivações estão associadas a diferentes necessidades humanas fundamentais.

A tendência ao narcisismo faz essas pessoas se concentrarem no reconhecimento e no status de elite que a fama oferece, em contraste com aqueles com maior necessidade de pertencer, que acabam atraídos pela fama como uma forma de fugir das ansiedades pessoais sobre exclusão social. Ambos, no entanto, compartilham da necessidade comum de serem vistos e valorizados em larga escala.

Influenciador: um novo sonho

(Fonte: Catraca Livre/Reprodução)(Fonte: Catraca Livre/Reprodução)

Atualmente, ser famoso está vinculado com o nível de popularidade na internet, principalmente no Instagram e no TikTok. Como ressaltou Thiago Cavalcante, sócio diretor da INFLR, "a internet democratizou a fama, dando oportunidade de não apenas uma celebridade de novela ser relevante, mas sim, qualquer pessoa que saiba utilizar as ferramentas ao seu favor".

A empresa global de inteligência Morning Consult, em pesquisa com 2 mil americanos de 13 a 38 anos, sobre a cultura dos influenciadores digitais, indicou que 53% deles aspiram a essa atividade por fama, horários flexíveis e outros benefícios. Em um mundo onde um pouco mais da metade da população vive com US$ 10 por dia, o dinheiro se tornou o gatilho de tudo.

Segundo a CNBC Make It, um influenciador com 15 mil seguidores pode ganhar quase US$ 500 por um post patrocinado, sendo que um influenciador com uma audiência de 50 mil pessoas pode alcançar mais de mil dólares por uma publicação, o que um norte-americano empregado formalmente pode demorar até duas semanas para ganhar.

O Brasil também não fica muito atrás. Uma pesquisa feita com 3.100 jovens, em janeiro desse ano pela INFLR, adtech, especializada em marketing de influência, mostrou que 75% deles revelaram ter vontade de ser influenciadores para inspirar outras pessoas; e 63% dos entrevistados mostram que aspiram ser uma influência no ambiente digital pelo retorno financeiro.

Saulo Camelo, sócio-fundador da Camelo Digital, empresa especializada em marketing, performance e tecnologia, disse ao Meio&Mensagem que, hoje em dia, ser influenciador digital já pode ser comparado ao sonho de se tornar jogador de futebol – algo muito comum entre os jovens dos anos 2000, principalmente os periféricos.

Influência sem referência

(Fonte: Pinterest/Reprodução)(Fonte: Pinterest/Reprodução)

Diante desses números e alegações, o ator Reynaldo Gianecchini, em entrevista recente à Gabriela Prioli, fez críticas duras sobre esse modelo de profissão. “Tudo bem ganhar dinheiro com o TikTok, que legal, eles estão fazendo um monte de coisa, mas também não podem só querer ganhar dinheiro rápido, ser famoso e esquecer que tem outras profissões incríveis, e que você pode estudar. A sensação que eu tenho é que ninguém, às vezes, quer estudar”, ressaltou ele.

O ator celebrou que a geração Z é mais antenada e engajada em vários assuntos, porém se queixou do desinteresse e falta de conhecimento, principalmente cultural, de muitos. “Eles querem fazer essa coisa de: ‘vamos fazer uma coisa de blogueirinho, vou ganhar meu dinheiro’, e depois não querem se aprofundar em mais nada. É isso que acho que tem que tomar cuidado”.

Apesar de atualmente qualquer um poder se tornar um influenciador digital, é preciso empreendedorismo e muito estudo para conseguir se destacar desse mar de pessoas e chegar a alguma posição de relevância; fora o foco, objetivos bem traçados e um planejamento estratégico e tático.

Mas em meio a dancinhas de TikTok e publicidades sobre robôs que supostamente geram dinheiro instantâneo, é impossível as pessoas não pensarem que seja fácil demais, ainda que esse excesso de facilidade sempre esteja associado a uma responsabilidade que poucos conseguem arcar, principalmente quando colocada nas mãos daqueles que não tem nenhuma referência alguma.

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