A fatal história da mulher mais odiada dos Estados Unidos

17/01/2020 às 14:005 min de leitura

De acordo com o instituto de pesquisa Gallup Daily, cerca de 73.7% dos estadunidenses são cristãos, sendo que 37% deles classificam a religiosidade como algo altamente de relevância em suas vidas, tanto cultural, social quanto politicamente.

E tem sido assim desde a colonização, tornando os Estados Unidos profundamente influenciados por vários aspectos religiosos em sua estrutura, tendo a sua maior marca batida em 1960, quando pesquisas registraram 90% de pessoas cristãs. Foi, no entanto, o suficiente para que uma mulher que somava esses 2% da parcela de ateus causasse uma revolução histórica e igualmente trágica nos Estados Unidos.

Madalyn Murray O’Hair ousou desafiar a fúria do cristianismo e se envolver num confronto sem volta que lhe custou muito mais do que imaginava, só que nem de perto da maneira que previa.

Isso não é para mim

(Fonte: El Comercio Perú/Reprodução)

Nascida Madalyn Mays no dia 13 de abril de 1919, em Pittsburgh, na Pensilvânia, e filha de Schoelle Christina e John Irvin Mays, ela era a única mulher e também a mais nova. Madalyn cresceu num lar totalmente cristão, tanto que aos quatro anos de idade ela foi formalmente batizada na Igreja Presbiteriana pelo seu pai, e na Luterana por sua mãe.

Criada numa família de classe média alta, quando ela tinha apenas 10 anos de idade, os pais perderam boa parte de sua fortuna devido a crise do mercado de ações em 1929, forçando o seu pai a se tornar um trabalhador braçal e itinerante. De acordo com ela mesma, foi durante a sua juventude, ao ver a sua mãe pedir por melhoras financeiras incessantemente e depositar todas as suas fichas em uma mudança Maior, que ela passou a contestar mais ferrenhamente os conceitos religiosos que a cercavam, deixando a religião cada vez mais de lado em sua vida.

Aos 22 anos, a sua filosofia de ateísmo se concretizou finalmente e Madalyn abandonou qualquer rastro de crença de sua vida. Em 9 de outubro de 1941, ela conheceu e se casou com John Henry Roth, trabalhador de uma usina siderúrgica. Porém, eles se divorciaram em 1945, assim que a mulher decidiu juntar esforços na Marinha durante a Segunda Guerra Mundial e servir como criptografista na Itália e na África.

Nessa época, Madalyn começou a ter um caso com o oficial William Murray Jr., com quem teve o seu primeiro filho, a quem deu o nome de William J. Murray III e adotou o seu sobrenome, Murray. Por ser um homem muito religioso, ele nunca quis deixar a esposa para ficar com ela. Em 1952, a mulher se formou em Direito pela South Texas College of Law, mas não conseguiu permanecer em um emprego devido as suas diferenças — a maioria religiosa e política — que tinha com os empregadores, além de seu temperamento descrito como explosivo e agressivo. Por isso se formou mais uma vez, só que em Assistência Social. Em 1954, ela deu à luz ao seu segundo filho, Jon Garth Murray, com Michael Fiorillo.

Todos contra uma

(Fonte: Timetoast/Reprodução)

Em 1960, Madalyn Murray saiu do anonimato e ganhou as manchetes dos jornais quando o seu filho mais velho, William, de 14 anos, reclamava de ter que fazer orações diárias em sua escola secundária em Baltimore. Sendo assim, a mulher deu início a uma verdadeira cruzada para derrubar as práticas religiosas na educação pública, entrando com um processo judicial contra as instituições de ensino público e colocando William como requerente. Desafiando um sistema antigo e enraizado na sociedade, a mulher defendia que as práticas de orações e leituras obrigatórias da Bíblia violavam a Constituição, a laicidade e também porque era uma forma de estabelecer uma religião.

O caso ficou conhecido como Murray Vs Curlett e fracassou no tribunal estadual e no de apelação, então ela moveu céus e terras para levá-lo à Suprema Corte dos Estados Unidos.  Durante todo o processo, Madalyn ganhou os noticiários e programas de todo o país, soltando suas falas polêmicas de que o pensamento religioso era fruto de ignorância e pura superstição. Ela foi atacada, ameaçada de morte e perseguida por fiéis, tendo que andar escoltada por seguranças. A sua casa foi depredada e invadida por desconhecidos. A vizinhança se voltou contra ela, assim como o bairro inteiro, promovendo protestos em frente a sua propriedade. O filho sofria opressão, era constantemente agredido na escola e os administradores não faziam nada a respeito, como uma forma de punição.

Em 1963, quando Madalyn venceu a sua luta judicial e declarou nacionalmente que tudo o que aquele caso pedia era “o direito inalienável a não ter uma religião”, decidiu se mudar para o Havaí, onde casou com Richard O’Hair, antes de se firmar no Texas e abrir a organização Ateus Americanos, em 1965.

Odiada por uma nação                                                

(Fonte: Fox 26 Houston/Reprodução)

A fundação sem fins lucrativos de Madalyn visava a separação entre Igreja e Estado e defendia os direitos civis dos não-crentes perante a Primeira Emenda. Ela lutou para que a frase “Em Deus nós acreditamos” fosse removida da cunhagem da moeda dos EUA e de que a isenção de impostos das igrejas deveria ser mudada, pois significava um apoio governamental à religião. Ela contestou a celebração do Natal nas escolas, argumentando que promovia uma religião acima de outras. Nenhuma dessas tentativas foram bem-sucedidas, mas outras 20 vieram.

Em 1964, a revista Time a nomeou como “A Mulher mais Odiada da América”, título esse que Madalyn adotou com gosto. Até lá, já mundialmente famosa e envolvida com vários aspectos políticos dos Estados Unidos, a associação de Madalyn lucrava milhares de dólares com doações e merchandising, dando a ela a vida de luxo que perdera durante a juventude.

O seu marido morreu em 1978 e ela obteve a custódia de Robin, sua neta, que estava envolvida com abuso de drogas e álcool. À essa altura, a mulher já havia sofrido a primeira grande reviravolta de sua vida quando William decidiu se converter cristão e se tornar um ministro batista. Aos 34 anos, ele se tornou o presidente da Coalização pela Liberdade Religiosa que, ironicamente, pregava restaurar a oração nas escolas.

No entanto, a maior e mais bizarra reviravolta da vida da ativista ainda estava para acontecer.

A premonição

(Fonte: madison.com/Reprodução)

No dia 22 de agosto de 1995, Madalyn Murray, o seu filho Jon Garth Murray e a neta adotiva, Robin, desapareceram da mansão onde moravam junto com 600 mil dólares dos caixas da instituição, deixando um aviso no escritório de que haviam deixado a cidade em caráter de urgência. Os seus funcionários continuaram a receber telefonemas dos patrões, embora parecessem tensos, quase perturbados, e jamais explicassen o motivo para o desaparecimento. Após esse dia, não obtiveram mais contato.

A súbita partida dos Murrays causou um frenesi pela mídia e ocupou os tabloides do mundo com a possibilidade de que a família pudesse ter sumido para evitar os credores, uma vez que a organização sofria com a retirada de fundos feita de repente por Jon Garth Murray. Não descartaram um possível sequestro, ainda mais com a quantidade de inimigos que Madalyn havia feito ao longo dos anos.

Embora, à princípio, o FBI não parecesse particularmente interessado em investigar o sumiço de uma mulher intitulada com "a mais odiada dos Estados Unidos", a Polícia Federal Americana impulsionou a movimentação de uma força-tarefa para rastrear a mulher, talvez como uma forma de vingança por tudo o que essa causara.

Apenas em janeiro de 2001 que os restos mortais de quatro corpos foram encontrados em uma fazenda de gado próximo a Camp Wood, ainda no Texas. Esses pertenciam a Madalyn, ao seu filho e a neta. O quarto era de Danny Fry, um dos sequestradores da família que executara o plano com David Rolan Water, um violento ex-funcionário dos Ateus Americanos. O homem foi condenado a 20 anos de prisão e morreu de câncer de pulmão em 2003.

Apesar de ter deixado um legado todo para trás, Madalyn Murray O’Hair foi cremada e ninguém chorou sobre o seu túmulo, tampouco os seus apoiadores apareceram em seu enterro. O seu rosto, no entanto, continuou circulando na mídia, reprisando a sua aparição em um programa de televisão em 1970 quando uma mulher da plateia pegou o microfone e disse, em tom de alerta, diante do sorriso desordeiro da ativista:

“Se você não retomar a razão, a sua morte vai ser tão horrível que mostrará a seus seguidores como você estava equivocada”.

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