Artes/cultura
30/09/2020 às 08:30•4 min de leitura
Com a paralisação das gravações, por conta da pandemia de covid-19, a Rede Globo está reprisando novelas de sucesso em todos os seus principais horários, desde março. Após o fim de Fina Estampa (2011), que revelou o segredo de Tereza Cristina, chegou a hora de relembrarmos A Força do Querer, um sucesso escrito em 2017, por Glória Perez.
Nessa produção, a autora abordou alguns temas polêmicos, que nunca haviam sido retratados em novelas. Começando pelo personagem transexual, Ivan/Ivana (vivido por Carol Duarte), e de Nonato (Silvero Pereira), que se revelava como Elis Miranda em seus shows — mas tinha que disfarçar sua sexualidade para o chefe preconceituoso.
Com a reprise, o público poderá relembrar também a trajetória de Bibi Perigosa (Juliana Paes), que foi capaz de cometer crimes para defender seu amado, Rubinho (Emílio Dantas), e sua rivalidade com a policial Jeiza (Paolla Oliveira). Além disso, há a história de Ritinha (Isis Valverde), a sereia que enlouquece os homens da novela.
Mas essa não é a primeira vez que Glória Perez escreve novelas com temas polêmicos e inovadores. Na verdade, ela é uma das autoras da Rede Globo que mais revela novas culturas e situações inusitadas para o público. Nesse post, relembramos algumas delas:
A ideia dessa novela era tão inovadora que foi considerada maluca pela cúpula da Rede Globo, em meados dos anos 80. Quando o projeto finalmente foi aprovado, Barriga de Aluguel foi um sucesso enorme e ficou quase um ano no ar — de agosto de 1990 até junho de 1991. O centro da história era a jovem Clara (Cláudia Abreu), que “alugava” seu útero para gerar o filho de Ana (Cássia Kiss) e Juca (Victor Fasano).
Ao longo da história, o público ficou dividido — qual das duas mães tinha direito a ficar com a criança? — e a novela chegou a contar com uma personagem-repórter, que ia às ruas para perguntar o que as pessoas achavam. No fim da história, o caso chegou à última instância na justiça e as duas mães concordaram em encontrar uma solução para a disputa, independente do que acontecesse.
Infelizmente, essa novela é mais lembrada pela morte da atriz Daniella Perez, filha da autora e que fazia parte do elenco, no papel de Yasmin — ela foi assassinada por seu colega, Guilherme de Pádua, e a esposa dele.
Mesmo abatida com a tragédia, a autora tirou apenas alguns dias de descanso e voltou a escrever sua novela até o final, aproveitando para fazer críticas ao sistema judicial brasileiro. É pela luta de Glória que o homicídio tem penas mais duras, hoje em dia.
Mas, independente disso, De Corpo e Alma apresentava uma história inovadora, centrada num transplante de coração: depois da morte de sua amante, Diogo (Tarcísio Meira) se apaixona pela mulher que recebe o órgão, Paloma (Cristiana Oliveira). Por causa da novela, as doações de órgãos aumentaram exponencialmente no país.
Paloma, por sua vez, era noiva de Juca (Victor Fasano), um homem que fazia striptease no Clube das Mulheres — era a primeira vez que os homens eram mostrados assim em novelas. Além disso, De Corpo e Alma mostrou duas famílias que descobriam que seus filhos haviam sido trocados na maternidade e tinha um personagem gótico (Eri Johnson).
Consagrada pelos sucessos anteriores, Glória Perez teve mais facilidade para aprovar o projeto dessa novela. Mas, dessa vez, foi o público que estranhoua história de um casal que se apaixona ao se conhecer pela internet. Afinal, em 1995, isso ainda parecia coisa de ficção científica. Como as coisas mudam, né?
Para tornar a novela ainda mais exótica, a mocinha do casal era Dara (Teresa Seiblitz), uma cigana. A cultura, as roupas e as danças desse grupo ganharam uma atenção que nunca tinham ganho no Brasil. Aliás, essa era a novela do cigano Igor (Ricardo Macchi), que ficou marcado na memória do público por sua atuação um tanto questionável.
Mas as inovações não paravam por aí: Explode Coração ainda tinha uma drag queen nos núcleos paralelos — Sarita Vitti (Floriano Peixoto) — e fez uma campanha em prol das crianças desaparecidas, que ajudou a reunir mais de 60 filhos e mães. Vale lembrar que a novela voltou recentemente ao Globoplay, para quem quiser assistir.
Provando que gosta mesmo de uma inovação, Glória Perez voltou ao horário nobre em 2001 com outros dois temas que parecem completamente distantes: afinal, como falar sobre a tradicional cultura árabe e a novidade da clonagem na mesma história?
Foi justamente esse o contraponto entre tradicional e moderno que a autora propôs no romance entre a muçulmana Jade (Giovanna Antonelli) e Lucas (Murilo Benício), afilhado do Dr. Albieri (Juca de Oliveira) que é clonado e acaba disputando sua amada com seu próprio clone, anos depois. Muito criativo, com certeza!
Vale lembrar que O Clone estreou logo depois dos ataques de 11 de setembro de 2001, que expuseram a cultura islâmica de forma negativa nas notícias. Mas logo a história caiu no gosto do público, fazendo com que as expressões e danças virassem mania.
Depois de O Clone, Glória Perez escreveu América (2005), onde abordou a imigração ilegal para os Estados Unidos e Caminho das Índias (2009), que retratou o sistema de castas e tinha um personagem esquizofrênico (Tarso, vivido por Bruno Gagliasso).
Já em Salve Jorge (2012), Glória Perez mostrou o tráfico de pessoas na Turquia, mas recebeu muitas críticas pela enorme quantidade de furos no roteiro e pela repetição de novelas que se passam em outros países. Por isso, a autora se decidiu se renovar e criou A Força do Querer, uma história totalmente ambientada no Brasil — mas, ainda assim inovadora, o que é marca registrada de Glória. E se você gostou desse texto, confira nossa outra lista de novelas, sobre as Helenas de Manoel Carlos.