Ciência
12/02/2022 às 07:00•3 min de leitura
Em 23 de abril de 1616, morreu William Shakespeare, mais conhecido como o “Bardo de Avon”, responsável por obras lendárias como Romeu e Julieta (1597), Hamlet (1603) e Macbeth (1623). A vida do artista sempre foi pautada por muitas teorias e falta de informações, inclusive a causa de sua morte é um verdadeiro mistério, e muitos historiadores acatam a ideia de que ele contraiu uma forte febre após uma noite de bebedeira com os amigos dramaturgos Ben Jonson e Michael Drayton.
Portanto, é de se esperar que essa falta imensa de registros tenha levado a apenas desconfianças, sobretudo no século XVII, mas não que tenha-se transformado no enredo perfeito para uma teoria da conspiração que ainda se arrasta pela modernidade.
Mas, então, quando as pessoas passaram a questionar se Shakespeare realmente existiu?
James Wilmot. (Fonte: Wikipedia/Reprodução)
Conspiração sempre começa com alguém que lança a possibilidade no ar quando ninguém pensou ou a infla com questões repletas de informações falsas e forçadas. Foi assim, por exemplo, que Bill Kaysing (1922-2005) criou a teoria da conspiração moderna de que Neil Armstrong nunca fincou a bandeira dos Estados Unidos na Lua, arrebanhando milhares de pessoas na mesma ideia até hoje.
Não foi muito diferente com um dos maiores dramaturgos da história mundial. Em meados de 1785, James Wilmot cunhou a primeira “teoria anti-Stratfordiana”, sugerindo que Shakespeare não havia escrito as peças e as poesias associadas ao seu nome.
Tudo teria começado quando Wilmot, um estudioso literário, decidiu escrever uma biografia abrangente sobre a vida do dramaturgo, cuja morte havia completado quase 200 anos naquela época. Ele realizou o trabalho que qualquer biógrafo faria no século XVIII para pesquisar um assunto: visitou a cidade natal do escritor, as casas que ele poderia ter entrado, e vasculhou bibliotecas nas redondezas de Stratford-on-Avon.
(Fonte: The Independent/Reprodução)
Mas ele não encontrou nenhum registro, assinatura ou informação sobre Shakespeare indicando que alguma vez ele sequer tocou em um livro ou escreveu uma carta. Era como se ele não existisse. Então Wilmot chegou à conclusão que já suspeitava: que peças letradas como aquelas não podiam ter sido escritas por um homem que não deixou nenhum rastro literário para trás — um pensamento claramente classicista.
Portanto, ele passou a palpitar de que talvez as obras fossem do altamente letrado Francis Bacon. Apesar disso, Wilmot nunca compartilhou sua ideia com o público, apenas com seu amigo James Corton Cowell, que fez uma série de palestras sobre o assunto em 1805.
Francis Bacon. (Fonte: Mynet/Reprodução)
No entanto, James Shapiro, conhecido como o maior estudioso sobre Shakespeare, alega que até mesmo essa versão de Wilmot tenha sido uma fabricação de pessoas do século XX em uma tentativa desesperada de fazer Bacon se destacar na história.
Isso porque nenhuma das palestras foram descobertas até 1931 e ficaram supostamente famosas por terem uma linguagem aquém do século em questão e serem baseadas em estudos de Shakespeare que não eram conhecidos até bem depois de 1805.
De qualquer forma, isso não impediu que a teoria decolasse na sociedade de 1857, quando foram publicados livros que argumentavam que Bacon havia escrito as obras do Bardo de Avon. Escrito por Delia Bacon e William H. Smith, os livros se tornaram uma sensação, servindo de combustível para arrebanhar o apoio de nomes célebres, como de Zigmund Freud, Malcolm X e Orson Welles.
(Fonte: American Minute/Reprodução)
Apesar de, na atualidade, a ideia ser sustentada por teoristas sobre como a sociedade têm facilidade para se enganar, no passado ganhou força por ser considerada emocionante e glamorosa, a epítome das conspirações secretas de um mundo conturbado como o literário. Era bem mais interessante achar que Shakespeare era a farsa de um ator medíocre vindo do meio do nada do que acreditar o contrário.
O motivo era que eles não achavam possível um jovem camponês, sem nenhum parentesco famoso ou letrado, poderia ter escrito peças complexas e profundas como aquelas. Afinal, onde mais ele teria aprendido latim, grego e francês?
Para o pensamento elitista da época, não fazia sentido que tivesse sido em uma escola primária, como foi, ainda que suas obras tenham referências de uma realidade que os ricos não tinham acesso.
Tudo isso é o suficiente para os anti-Stratfordianos descartarem montanhas de estudos que comprovam que Shakespeare era um poeta na tentativa de refazer a história literária elisabetana.