Ciência
22/11/2022 às 04:00•2 min de leitura
O próximo filme de Will Smith, chamado Emancipation, tem trazido novamente luz a um episódio horrendo da história americana. No filme, Smith vive um homem chamado Peter, que realmente existiu. Ele foi um homem escravizado cuja foto do corpo coberto de cicatrizes expôs o horror da escravidão e impossibilitou que ela fosse condenada pela opinião pública.
Neste texto, contamos a história de Peter e como aquela foto mudou o curso da história.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Não se sabe o sobrenome de Peter, um homem escravizado que, em 1863, conseguiu fugir da fazenda onde estava. Não foi uma tarefa fácil: Peter percorreu quilômetros descalço até chegar em um acampamento da União em Baton Rouge.
Quando chegou até os soldados, depois de dez dias de fuga, Peter estava encharcado de lama e suor e sua roupa estava completamente esfarrapada. Mas mesmo este período não se comparava em nada ao que o homem havia passado. Ele foi escravizado na Louisiana, e tinha recebido uma surra que quase tirou a sua vida.
Quando ele alcançou o Exército da União, Peter foi examinado por médicos, que viram suas costas cobertas de cicatrizes. Eram vergões causados por chicotadas e marcas de bala, que se estendiam das nádegas até os ombros. O seu corpo castigado se tornou uma prova visual da brutalidade causada pela escravidão — algo tipo como normal ou aceitável para milhares de brancos americanos.
(Fonte: Twitter)
Uma foto tirada do corpo despido de Peter ajudou a aumentar a revolta contra a escravidão e fortalecer o movimento pela abolição. Ela serviu como argumento sobre o quão desumana era a escravidão, e suscitou a convicção entre os estados do norte dos Estados Unidos a favor do fim deste crime, o que ia contra à insistência dos estados sulistas para que ela fosse mantida.
Não se sabe muito sobre Peter além do que ele contou aos médicos legistas do acampamento. Ele testemunhou que havia fugido de uma plantação e que o homem que o chicoteou seria um capataz chamado Artayou Carrier.
Juntamente a outros três homens escravizados, ele resolveu fugir na madrugada, mas um de seus companheiros foi assassinado por um caçador de escravizados. Os que sobreviveram à perseguição chegaram depois de vários dias ao acampamento da União, e teriam chorado ao ver que havia negros fardados no exército.
Os soldados que inspecionaram Peter ficaram horrorizados com o estado dele. Ainda que aquelas pessoas soubessem da escravidão do sul, o fato é que elas nunca haviam testemunhado de fato a brutalidade causada por esse crime.
Dois fotógrafos itinerantes, chamados McPherson e Oliver, estavam no acampamento naquele dia. Foram eles que fotografaram as costas de Peter e produziram pequenos cartões com elas, que foram distribuídos amplamente.
Rapidamente, aquela foto se espalhou pelo país. No verso do cartão, JW Mercer, um cirurgião do Exército da União na Louisiana, havia escrito: “descobri que um grande número dos cerca de quatrocentos fugitivos examinados por mim estavam tão dilacerados quanto o espécime representado na fotografia anexa”.
Um jornalista escreveu na época: “esta fotografia do cartão deve ser multiplicada por 100.000 e espalhada pelos Estados Unidos”. A imagem de Peter se tornou um poderoso testemunho de que as pessoas escravizadas não eram tratadas com humanidade. Era este o argumento usado pelos tantos defensores da escravidão, que se posicionavam contra a sua abolição.
Embora aquela não tenha sido a única foto chocante de pessoas escravizadas, certamente foi a mais impactante. A foto foi vendida por abolicionistas, que a usaram para arrecadar dinheiro para a sua causa. A imagem ganhou os apelidos de “The Scourged Back” (As costas açoitadas) e “Whipped Peter” (Peter Chicoteado), e entrou definitivamente para a história como uma prova viva do que os seres humanos são capazes de fazer com outros.