Artes/cultura
27/09/2024 às 06:00•2 min de leituraAtualizado em 27/09/2024 às 06:00
Um dos equívocos quando se fala em Holocausto é pensar que o extermínio sistemático dos judeus europeus pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial tenha sido uma espécie de ato de loucura, adotado por um perverso. Na verdade, esse tipo de “solução final”, como eles a definiram, é parte de um processo planejado, estruturado e executado durante muito tempo.
Em 1878, quando ainda nem se pensava em Terceiro Reich, o estudioso alemão Paul de Lagarde, expert em culturas do Oriente, propôs em seu livro Escritos Alemães que os judeus da Europa deveriam ser “encorajados” ou diretamente deportados para a ilha de Madagascar, na África.
Essa aparente "preocupação com o bem-estar dos judeus", vítimas constantes de pogroms (perseguições e massacres) em países da Europa Oriental e na Rússia imperial, escondia na verdade o temor de que ondas de imigrantes judeus chegassem aos países da Europa Ocidental, principalmente no Reino Unido e França, além da Alemanha, que já abrigava uma significative população judaica.
Essa ideia odiosa, que combinava antissemitismo religioso, cultural e racial, além de teorias da conspiração, nacionalismo e racismo, era defendida por vários países, e chegou mesmo a ser considerada pelo Movimento Sionista, que considerava a ideia um primeiro passo para o assentamento judaico na Palestina.
Em 1937, o governo da Polônia arquitetou com a França, então país dominante de Madagascar, a viabilidade de transformar a ilha em uma comunidade israelense. No entanto, uma força-tarefa enviada apurou que o local poderia acomodar, no máximo, 7 mil famílias, e o plano foi arquivado.
No ano seguinte, após os judeus terem sido privados de seus direitos na Alemanha pelas leis de Nuremberg, a primeira “solução final” foi: deportar todos eles para Madagascar.
Depois que a França se rendeu incondicionalmente em julho de 1940, o Plano Madagascar voltou a ganhar força entre os governantes nazistas, mas não pôde ser implementado, pois a Marinha Real Britânica controlava todas as rotas marítimas fora da Europa. Confiante em uma vitória sobre a Grã-Bretanha, Hitler passou a flertar com a ideia de que a frota mercante britânica pudesse ser requisitada para levar os judeus da Europa para a ilha africana.
A derrota da força aérea alemã na Batalha da Grã-Bretanha foi um balde de água fria nas pretensões alemãs, pois os britânicos continuaram no controle dos mares. Para piorar as coisas para os nazistas, os Aliados invadiram Madagascar em 1942, e colocaram a ilha sob controle da França Livre.
No dia 20 de janeiro de 1942, uma delegação de autoridades alemãs se reuniu em Berlim e resolveu de uma vez por todas o “problema judaico”, optando pela Solução Final, eufemismo para o plano de genocídio sistemático da população judaica na Europa. Embora o Projeto Madagascar tenha sido esquecido, ele foi o “ovo da serpente”, um alerta para a necessidade de denunciar ideologias perigosas em seus estágios iniciais.