Estilo de vida
07/07/2024 às 09:00•2 min de leituraAtualizado em 07/07/2024 às 09:00
A história de que Jesus Cristo teria ido para o inferno tem origem, paradoxalmente, em uma das orações que mais exaltam a fé cristã: o Credo dos Apóstolos. Considerada uma síntese primordial da fé primitiva em Cristo, a prece tem sido recitada por mais de dois mil anos em diversas igrejas ao redor do mundo.
Para quem não vai, ou está afastado da igreja, a treta começa naquela parte do Credo que diz: "Sofreu sob Pôncio Pilatos, foi crucificado, morto e sepultado. Desceu à mansão dos mortos e ressuscitou no terceiro dia, conforme as escrituras". Como em grego, a língua na qual foi escrito o Novo Testamento, a palavras Hades (mansão dos mortos) é também submundo ou inferno, a confusão teve início.
Esse evento, literalmente infernal, sugere que, entre a sua morte na Sexta-Feira Santa e a ressurreição, celebrada no Domingo de Páscoa, o filho de Deus teria dado uma passadinha no inferno. Para piorar a situação, esse suposto Descensus Christi ad Inferos suscitou debates teológicos acalorados e todo um ciclo de obras de arte que durou até o começo da Era Moderna.
Quem acha que há muitas polêmicas nas redes sociais atualmente, não tem ideia do que foi o impacto do "The Harrowing of Hell" (Angústia do Inferno, em tradução literal) na arte, literatura e música ao longo da história cristã. Foram centenas de poemas, hinos e peças musicais explorando temas que vão da redenção à esperança.
Embora não haja nenhuma menção do Credo dos Apóstolos na bíblia, a teologia cristã está recheada de versões. A mais comum delas é que Jesus teria ido ao limbo, uma espécie de antessala do inferno (cancelada na prática pelo papa Bento XVI), para libertar as almas dos justos do Antigo Testamento, como Adão e Eva.
A discutida peregrinação também é cantada como uma descida triunfal, para celebrar a vitória de Cristo sobre Satanás e o pecado, e a liberação da humanidade do poder do mal. Alguns também acreditam que Jesus aproveitou aquele momento de vitória, para dar um indulto aos que estavam no inferno, concedendo a todos uma oportunidade de arrependimento e redenção.
O que se deduz de toda essa controvérsia milenar em torno da ida ou não de Jesus para o inferno é que tudo não passa de uma questão de tradução e terminologia. No início, hove referência ao Sheol, que é a noção hebraica para mundo dos mortos, depois veio o Hades, que reforça a ideia de eterno tormento.
Finalmente, se formos buscar o relato literal de Jesus indo para o inferno na própria Bíblia, não encontraremos nada, pois, do ponto de vista histórico e teológico, ela não passa de uma secular fake news.