Estilo de vida
06/02/2021 às 03:00•3 min de leitura
Desde o início da pandemia do novo coronavírus, em março de 2020, os médicos e os estudiosos alertam a população do mundo todo sobre os benefícios do distanciamento social para combate à disseminação do vírus. A redução substancial diminui as hospitalizações, evita a superpopulação de UTIs, o uso de ventilação mecânica e as mortes cumulativas.
Fronteiras, bares, restaurantes, baladas, pontos turísticos, escolas, teatros e outros meios de lazer e entretenimento que geram aglomerações ou tenham mais de 10 pessoas foram fechados em todos os países como meio de prevenção. O uso contínuo de máscara e a higiene correta das mãos também são fatores importantes para combater o contágio, enquanto a maior parte da população mundial ainda não é vacinada.
O Brasil, os Estados Unidos, o Irã, o México e a Colômbia aparecem em um ranking como um dos piores países na gestão da pandemia, isso porque não consideraram, como deveriam, as medidas de prevenção.
Muito embora o vírus seja novo no mundo, a situação pela qual estamos vivendo — com taxas de infecção e mortes aumentando a cada dia (já são mais de 101 milhões de casos e 2 milhões de mortos no mundo todo) — já aconteceu em décadas passadas.
A gripe espanhola é considerada a pior pandemia da história moderna, tendo infectado cerca de 500 milhões de pessoas no mundo, causando 50 milhões de mortes, das quais 675 mil ocorreram só no território dos Estados Unidos.
As pessoas começaram a ficar doentes a partir de março de 1918, com os primeiros casos sendo reportados no Kansas. Porém, a situação piorou quando o vírus alcançou os acampamentos militares abarrotados e se espalhou rapidamente pelos campos de batalha — devido às más condições de saneamento básico e à nutrição dos soldados.
Os meses finais da Primeira Guerra Mundial contribuíram para que acontecesse uma “explosão” na taxa de contágio, porque esses homens doentes, com pneumonias bacterianas em desenvolvimento em seus pulmões enfraquecidos, povoaram os centros urbanos novamente. Eles também foram os responsáveis por trazer da guerra uma variante do vírus da gripe espanhola, que causou uma segunda “onda” devastadora durante os 3 meses cruéis do outono de 1918.
Em 17 de setembro daquele ano, o estado da Filadélfia registrou o primeiro caso de infecção pelo vírus influenza A, de subtipo H1N1, enquanto outros estados já sofriam mortalmente dos efeitos da doença. Como método de prevenção, o governo municipal lançou campanhas contra tossir, cuspir e espirrar em público.
Apesar de o número de casos aumentarem a cada dia, cerca de 10 dias depois o governo municipal decidiu ignorar as próprias medidas devido ao espírito patriótico da nação. Eles acharam adequado reunir esforços para demonstrar apoio moral aos sobreviventes dos campos de batalha e também para arrecadar fundos destinados ao pagamento da guerra. Esperavam erguer a quantia de no mínimo US$ 259 milhões, portanto a festa precisava ser grande.
Então foi anunciado o Desfile da Filadélfia para Empréstimos da Liberdade, um evento que reuniria escoteiros, militares, carros alegóricos, bandas, comida e outras atrações. Tudo isso ao longo da Broad Street, que tem cerca de 3 quilômetros de extensão.
Em 28 de setembro de 1918, mais de 200 mil habitantes da cidade compareceram ao desfile, projetado para receber um público 20 vezes menor do que aquele. O governo arrecadou mais de US$ 600 milhões para os cofres, e o desfile se tornou o maior da história do estado.
A “conta” da aglomeração insensata chegou 2 dias depois, quando todos os leitos dos 31 hospitais da cidade ultrapassaram a ocupação. Em 3 de outubro, o governo decretou o fechamento de escolas, igrejas, teatros e espaços públicos que pudessem acumular público, quando descobriram que mais de 47 mil pessoas foram infectadas. Na semana seguinte, por volta de 2,6 mil pessoas morreram pela gripe espanhola ou de complicações dela. Em 10 de outubro, o número alcançou a casa de 4,5 mil óbitos.
De acordo com a Universidade da Pensilvânia, em 6 meses de contágio na Filadélfia cerca de 16 mil cadáveres foram enterrados em covas comuns, exatamente como aconteceu em 2020 pelo novo coronavírus.
Ainda assim, há quem faça pouco caso do distanciamento social e promova esse tipo de aglomeração, reforçando a incapacidade de olhar para o único retrovisor possível: o da história.