Artes/cultura
04/03/2022 às 06:30•2 min de leitura
Em uma época em que mulheres eram acusadas de praticar bruxaria e submetidas a um "teste divino", no qual envolvia afundá-las em um lago que provaria a existência de um pacto feito com o diabo ou não, não existe muita surpresa no fato de que júris, há 800 anos, usassem métodos de provação para culpar ou inocentar um condenado "aos olhos de Deus".
Assim era a ordália, também conhecida como “juízo de Deus”, uma antiga prática judicial que visava determinar a culpa ou a inocência de um acusado o submetendo a uma experiência dolorosa. Ela foi adotada durante a época da Europa medieval (séculos IX e XII) apesar de ter raízes ainda mais distantes, em 1772 a.C., no tempo de Hamurábi.
A promotoria acreditava que, por meio desse procedimento mortal e arriscado, Deus ajudaria o inocente realizando um milagre em seu nome e o salvando daquela situação. Caso isso não acontecesse, ficaria então provada a culpa da pessoa.
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(Fonte: Getty Images)
Na época, o método foi considerado o mais eficaz como meio de julgamento, ainda mais quando não havia evidências ou testemunhas, visto que Deus era a autoridade máxima que sabia de absolutamente tudo.
As pessoas baseavam a vida em respostas divinas feitas por meio de oráculos, interpretação de sonhos, leitura de grãos ou sementes; portanto, no tribunal isso não seria diferente.
Existiam 8 tipos de julgamento por ordália, sendo eles por combate, água, envenenamento, grama, ingestão, crucificação e fogo. Entre estes, o acusado era obrigado a caminhar sobre o fogo por quase 3 metros, resgatar um item de um barril com água fervente, ficar com os braços estendidos pelo maior tempo ou engolir um pedaço de pão seco com queijo e não se engasgar.
Se o réu conseguisse sair vivo, com ferimentos leves, significava que isso era uma resposta divina, e Deus havia impedido a punição. Por esse motivo, muitos assumiam seus crimes antes de serem submetidos ao julgamento, ainda que fossem inocentes, porque isso era melhor do que desafiar Deus e brincar com um processo do qual não sairiam inteiros ou vivos.
(Fonte: Wikimedia Commons)
Os papas foram os únicos que se opuseram à ordália, ainda que existam relatos apócrifos descrevendo a cooperação de alguns deles com a prática. Em 1215, o Papa Inocêncio III, no Quarto Concílio de Latrão, promulgou um cânon proibindo a benção dos participantes antes das provações, deixando claro que em nada Deus poderia ter a ver com aquilo.
Mas foi só o Sacro Imperador Romano Frederico II que proibiu explicitamente os julgamentos por ordália ao considerá-los irracionais. Na Inglaterra, a decisão só entrou em vigor sob a conduta do Rei Henrique III em meados de 1220.