Estilo de vida
11/10/2024 às 12:00•2 min de leituraAtualizado em 11/10/2024 às 12:00
Uma das histórias mais interessantes da mitologia grega é a de Perséfone, uma jovem que foi raptada de sua mãe e obrigada a casar com o deus Hades. Seu narrativa é dramática: certo dia, a bela moça, filha de Deméter, colhia flores, quando chamou a atenção de Hades, o deus do submundo, que a levou para ser sua rainha.
A tristeza de sua mãe Deméter, que era a deusa da colheita e da agricultura, foi tanta que as terras se tornaram estéreis e os alimentos acabaram. Isso fez com que Zeus ordenasse a devolução de Perséfone. Mas ela tinha comido sementes de romã e, por isso, não pode voltar completamente à terra. A decisão foi equilibrada: a jovem passaria metade do ano com sua mãe, e o restante do tempo com seu marido, no submundo.
Contudo, historiadores afirmam que o conto de Hades e Perséfone – que explica o surgimento das estações do ano – pode ter alguns equívocos que foram se perpetuando com o tempo. Vejamos quais são.
Algumas versões do mito difundem a ideia de que Hades e Perséfone tiveram um casamento "convencional", mas indícios históricos falam muito mais de uma união forçada. Em Metamorfoses, do poeta romano Ovídio, lê-se uma descrição de Perséfone como uma pessoa "aterrorizada" e "forçada". Já sua mãe Deméter teria ficado furiosa com o rapto e, por isso, "culpou todos os países e gritou contra sua ingratidão básica" antes de tirar "o presente do milho".
Nos relatos sobre os matrimônios na antiguidade, as famílias dos cônjuges tinham que concordar formalmente com uma união. Mas isso não acontece nesse mito. O que se lê nos registros é que Perséfone, que era bem mais nova que o marido, teria ido "morar" com Hades. A história também revela que Hades não teria demonstrado respeito à sogra, o que coloca toda a trama como um conto moral de advertência sobre uma união conjugal inadequada.
A expectativa de que os casamentos devem ser felizes e amorosos é uma perspectiva muito moderna. Na antiga Hélade, pressupunha-se esse tipo de união como um contrato entre grupos de pares destinado a fortalecer os laços comunitários.
Tratava-se também de um evento mais social que individual, com objetivo de produzir filhos que perpetuassem uma tribo. Por isso tudo, interpretar o casamento de Hades e Perséfone apenas como infeliz é olhar para a história com uma perspectiva errônea, pois vinda do presente.
Talvez uma das versões mais malucas do mito seja a que coloca a história de Hades e Perséfone como um romance sensual e erótico, de um sujeito perigoso que se apaixona, toma uma mulher para si e a arrebata.
Essa abordagem erótica é falsa e, mais uma vez, olhada por uma perspectiva enviesada. Para comprovar isso, basta olhar para as várias esculturas gregas famosas que retratam esse mito. Uma delas é O Rapto de Proserpina, de Gian Lorenzo Bernini, que denota uma franca visão violenta desse episódio mitológico.
O erro aqui se dá principalmente pela grande diferença de idade entre os dois: Hades é geralmente concebido como um homem de meia-idade, enquanto Perséfone é mostrada como uma jovem mulher. Só que, para os antigos helenos, uma adolescente não era jovem demais para se casar.
Na antiguidade, os homens geralmente eram bem mais velhos que as mulheres quando contraíam matrimônio. Já elas precisavam ser jovens porque a sua principal obrigação era ter filhos – não tê-los significaria não haver sociedade futura.