Ciência
24/06/2024 às 18:00•3 min de leituraAtualizado em 24/06/2024 às 18:00
Em 2003, o Japão tinha um objetivo: atrair pelo menos 10 milhões de turistas estrangeiros até 2010, para afastar o fantasma deixado pela recessão global de 2001 e os efeitos do Grande Terremoto do Leste do Japão. Foi assim que lançaram a campanha "Visite o Japão", uma iniciativa do Ministério dos Transportes, que acompanhou, em 2006, a lei básica para promover o turismo e o estabelecer como um pilar que ajudaria no desenvolvimento econômico da nação.
A Agência de Turismo do Japão foi inaugurada em 1º de outubro de 2008 para que uma série de revisões políticas sobre o turismo fosse facilitada, tal como os regulamentos de vistos para viajantes chineses ricos e o alívio nas obrigações para sua emissão. Mas isso não foi tudo, a campanha criou destinos turísticos atraentes no Japão para os estrangeiros, modernizou a indústria para atender às necessidades dos viajantes, como a introdução do inglês como idioma; formulou e promoveu a utilização de talentos na área do turismo; e preparou e desenvolveu medidas de segurança para quem fosse fazer turismo.
Toda essa reestruturação valeu a pena. Conforme a Organização Nacional de Turismo do Japão (JNTO), a nação não só atingiu a marca dos 10 milhões no tempo estipulado como enredou em uma crescente constante. Em 2016, mais de 20 milhões de pessoas visitaram o Japão, ultrapassando 30 milhões em 2018 e atingindo um recorde de 31,88 milhões em 2019. Só nesse ano, os turistas de entrada gastaram 4,8 trilhões de ienes, o equivalente a US$ 32 bilhões. Em 2023, o levantamento feito pelo Statista mostrou que o número de visitantes foi de aproximadamente 25 milhões, em sua maioria de países do Leste Asiático.
No entanto, o excesso de pessoas – e seu desrespeito – resultou em algumas medidas drásticas para preservar os pontos turísticos, como erguer uma barreira para bloquear uma famosa vista do Monte Fuji.
Localizado na região central da ilha de Honshu, na fronteira entre as províncias de Shizouka e Yamanashi, o Monte Fuji é o pico mais alto do Japão, com cerca de 3.776 metros de altura acima do nível do mar. Famoso por sua forma cônica perfeita, a mais reconhecível do mundo, além de sua importância cultural e espiritual para os japoneses, é possível enxergar a montanha de grandes distâncias em dias claros e sem poluição atmosférica. Esse é o caso, por exemplo, de Tóquio, que está a aproximadamente 100 quilômetros de distância em linha reta da montanha.
O número de turistas mais do que dobrou desde que a montanha recebeu o título de Patrimônio Mundial em 2013, chegando a receber 5 milhões de pessoas em 2019. Não é para menos que os observatórios da montanha ficam abertos apenas por dois meses, entre julho e agosto de cada ano, e isso já é o suficiente para acumular milhares de pessoas por temporada. Essas são responsáveis por deixar muito mais do que seu dinheiro em restaurantes e lembrancinhas, mas também muito lixo, além de desrespeitar as regras, como fumar em local proibido e se aglomerar em estacionamentos e outros locais para obter uma foto instagramável.
Foi por isso que as autoridades de Fujikawaguchiko, na província de Yamanashi, ergueram uma barreira em frente à loja de conveniência Lawson, que se tornou um popular ponto turístico por guardar uma das vistas mais emblemáticas do Monte Fuji. Em maio desse ano, foi erguido uma rede de malha de 2,5 metros de altura e 20 de comprimento atrás da loja para tentar dispersar os turistas, em sua maioria não japoneses.
“Acho decepcionante que eles estejam colocando isso. É obviamente uma foto icônica”, disse Christina Roys, uma turista da Nova Zelândia, em entrevista à France24. “Mas é completamente compreensível. Estávamos aqui ontem à noite, antes de colocarem a tela, e havia muitas pessoas”, completou a turista.
A medida foi um movimento desesperado das autoridades de Fujikawaguchiko para prevenir acidentes e resguardar a paz dos moradores, que chegaram a reclamar de que os turistas subiam no topo de carros e até nos telhados de algumas casas para obter o clique perfeito da montanha.
A cidadezinha não foi a única que tomou uma ação para restringir o excesso de turismo no Japão, o mesmo fez a prefeitura de Kyoto, antiga capital do país, famosa por seus vários templos budistas, jardins, palácios imperiais e santuários.
Gion é conhecido como o bairro das gueixas em Kyoto, onde é possível ver uma variedade de artistas e mulheres caminhando pelas ruas em seus trajes tradicionais. Em dezembro de 2023, um conselho de moradores instou o governo de Kyoto a tomar medidas contra turistas indisciplinados, a divulgação do bairro como "um parque temático", e sobre a quantidade de assédio que as gueixas sofrem. Eles também reclamaram de que os turistas não respeitam os avisos de distância, chegando a invadir até mesmo propriedades privadas.
Em resposta, as autoridades de Kyoto alegaram que a proibição de acessar as ruas privadas de Gion entraria em vigor até maio, mas não informou como a restrição será aplicada. Enquanto isso, os moradores lutam da sua forma para exigir o mínimo de respeito.