Ciência
31/08/2020 às 13:30•2 min de leitura
Em 2018, o mundo foi alertado sobre a extinção da mais popular (e comercial) espécie de banana, dizimada por uma praga ainda sem nenhum controle. A fruta é apenas uma entre dezenas de espécies de plantas comestíveis cuja manipulação humana deixou pelo caminho a variedade genética – o que os cientistas estão tentando recuperar com a ajuda da manipulação dos genes através do Crispr, técnica em que uma enzima bacteriana é usada para editar sequências de DNA.
Um dos expoentes na área é o agrônomo e botânico Lázaro Eustáquio Pereira Peres, especialista em fisiologia vegetal. Ele e sua equipe da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP), em vez de tentar consertar milênios de domesticação, se voltaram para a espécie selvagem e, a partir daí, usaram a edição do DNA para recuperar algumas das melhores características do tomate.
“Combinamos características agronomicamente desejáveis com outras úteis, presentes em linhagens selvagens. Com a domesticação, houve alteração não somente na morfologia como no tamanho, no número de tomates em cada ramo e no seu valor nutricional. As características benéficas das espécies selvagens, como resistência a doenças e tolerância ao estresse, foram perdidas”, explica ele no estudo publicado na Nature.
Um dos primeiros resultados foi um tomate geneticamente modificado que produz 500% mais licopeno (um antioxidante celular) em relação ao tomate selvagem. Em dois anos, eles partiram de um tomate melhor, porém minúsculo, para frutos três vezes maiores, com dez vezes mais tomates em cada ramo, e mantendo as mesmas características aprimoradas.
O tomate selvagem é resistente, mas minúsculo; foram precisos milênios de seleção humana para chegar ao fruto que consumimos hoje.
Controlar os caminhos genéticos pode ser a chave para conseguir vegetais mais nutritivos e resistentes tanto a pragas como aos elementos, como o frio e a seca. Peres é um entre milhares de pesquisadores ao redor do mundo, em centenas de laboratórios de pesquisa e desenvolvimento, trabalhando naquela que é considerada a próxima revolução alimentar.
A Crispr (acrônimo para Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats, ou Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas) está sendo usada hoje desde no clareamento de cogumelos (que escurecem quando fatiados) à criação de grãos de café sem cafeína e trigo com níveis reduzidos de glúten, passando pela sobrevivência de frutas altamente consumidas mundialmente, como a já citada banana e o cacau, ambos atacados por pragas ainda sem remédio, cuja única cura é a incineração de toda a plantação.
A busca por ancestrais de alimentos está acontecendo também em um canto idílico da Itália, pelas mãos da agrônoma especializada em genética Isabella Dalla Ragione – plantas que não sobreviveram à transição para a agricultura industrial, nos anos 1950, quando variedades que não cresciam rapidamente, tinham baixo rendimento ou não podiam ser colhidas mecanicamente foram abandonadas.
Isabella procurou em arquivos, campos abandonados e pomares de monastérios – até perceber que as melhores pistas estavam em museus e palácios italianos: afrescos e pinturas renascentistas como o quadro de Albrecht Dürera "Madonna e a criança com a pera" – que é, na verdade, uma maçã.
Depois de encontrar uma espécie perdida, a agrônoma planta três amostras em sua fazenda; depois que elas frutificam, ela oferecer mudas no site da Archeologia Arborea, a organização que fundou há mais de 20 anos. “Algumas dessas frutas estão crescendo em lugares distantes como os EUA ou a Austrália”, diz ela.
Manipulação do DNA é a base da nova revolução alimentar via TecMundo