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30/03/2021 às 11:00•2 min de leitura
Frequentemente se fala nos abusos cometidos no campo da pesquisa científica. Cobaias humanas desses estudos criminosos geralmente possuíam algum tipo de vulnerabilidade física ou social. Foi com esse perfil que, no dia 1º de abril de 1951, a jovem Henrietta Lacks, mãe de cinco filhos e descendente de uma família de pessoas escravizadas, chegou ao Hospital John Hopkins, em Baltimore nos EUA.
Em 1997, o médico que atendeu a moça, dr. Howard Jones explicou à BBC a condição diferenciada que a levou ao hospital: "ela sangrava entre as menstruações, tinha dores abdominais". Porém, ao examinar o colo do útero, o médico se surpreendeu com um tipo de tumor especial: "era roxo e sangrava facilmente quando tocado".
Diagnosticada como tumor cancerígeno, a neoplasia não respondeu aos tratamentos, e Henrietta, com apenas 31 anos, morreu de câncer cervical em outubro. Um médico que fazia estudos sobre o câncer no hospital, dr. George Gey, foi até o corpo e, com autorização do viúvo, retirou um pedaço de tecido, dizendo ser para uma autópsia que iria proteger os dependentes da falecida.
Fonte: Wikimedia Commons
Depois de retirar as células do tumor de Henrietta Lacks, o médico, que também retirara material durante o tratamento, conservou-as na unidade hospitalar de câncer. Ele descobriu que, mesmo após a morte da "doadora" involuntária, essas unidades estruturais continuaram se reproduzindo indefinidamente em laboratório.
As células eram exatamente o que os pesquisadores da doença procuravam por décadas, e a única consideração que Gey teve foi batizar a sequência com as iniciais do nome da pobre paciente: HeLa. Ainda hoje, essas células continuam crescendo e se multiplicando, sendo continuamente utilizadas para pesquisas sobre o câncer em inúmeros laboratórios do mundo.
No livro A Vida Imortal de Henrietta Lacks, de 2010, a autora Rebecca Skloot conta toda a história, e provoca uma reflexão sobre a questão da ética em pesquisas científicas e da proteção dos direitos dos participantes de estudos clínicos. Uma das principais discussões é a falta de consentimento de Henrietta para a retirada de suas células para fins de pesquisa durante o seu tratamento.
A família de Henrietta jamais recebeu qualquer remuneração pela comercialização das células da matriarca. A violação até hoje é questionada. Afinal, até que ponto os direitos individuais se sobrepõem ao compromisso público com o progresso da ciência?