Ciência
24/05/2022 às 06:30•2 min de leitura
O polo tecnológico do Vale do Silício é centro de diversas invenções — mas nem tudo o que sai dali promove benefícios para a sociedade. Uma das mais novas práticas advindas do Vale do Silício é o jejum de dopamina, que consiste em abdicar de atividades prazerosas (até mesmo de alimentação), adotado por empreendedores e estudantes da região que buscam melhorar o bem estar e a produtividade.
A prática vai na contramão do que promete. O erro já começa pelo nome, já que jejum é referente à comida e a dopamina é um neurotransmissor sintetizado a partir do aminoácido tirosina na glândula suprarrenal e em quatro regiões do cérebro: nigroestriatal, mesolímbica, mesocortical e túbero infundibular.
Este neurotransmissor promove sentimentos de prazer, motivação e recompensa. Logo, um "jejum" desta substância iria trazer sensações opostas, podendo desencadear precursores que afetam as condições de ordem psicológica que geram comprometimento na vida normal de uma pessoa, podendo levar à depressão.
Os adeptos do jejum de dopamina acreditam que o ser humano passa muito tempo com atividades improdutivas devido ao fato de buscar cada vez mais os efeitos desse neurotransmissor. O vício de dopamina existe e está também na facilidade, onde para se obter a "recompensa" não é necessário gastar muita energia. Mas a solução para isso não é um jejum de dopamina: é interromper atividades que já se sabe das consequências ruins e adotar mudanças no modo de vida para ter uma saúde mental e produtividade melhor.
Há indivíduos que praticam o jejum de dopamina e suspendem a alimentação, ingerindo apenas água — aí já está outro erro, porque se trata de deixar de ingerir nutrientes essenciais para o funcionamento do organismo. Outra prática é evitar interagir com outras pessoas e abdicar do uso do smartphone.
De todas as práticas, somente suspender o uso do celular é vantajoso. Já se sabe que é maléfico o uso abusivo do celular, portanto devemos usar o aparelho com sabedoria e podemos obter benefícios de períodos sem smartphone, enquanto suspender a ingestão de nutrientes essenciais para o corpo… isso é cientificamente prejudicial para o organismo.
Nosso cérebro é plástico, molda-se mediante às circunstâncias duradouras. Pessoas com depressão, por exemplo, têm a anatomia do cérebro modificada, apresentando uma redução de tamanho no hipocampo, a amígdala e o córtex pré-frontal. Quando nos colocamos em uma atmosfera negativa, desmotivada, sem prazer, com o passar do tempo o cérebro é moldado da mesma maneira.
Quando a prática de jejum de dopamina é recorrente, uma das possíveis consequências é alterar a personalidade da pessoa, gerar comportamentos maléficos recorrentes e também depressão. As coisas não podem ser analisadas de forma superficial: é preciso ter muita cautela antes de adotar métodos da “moda” sem qualquer tipo de respaldo científico. Caso contrário, o resultado pode ser justamente o contrário do que se espera — como é o caso do jejum de dopamina.
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Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, colunista do Mega Curioso, é PhD em Neurociências; mestre em Psicologia; Pós Graduado em neuropsicologia, entre outras pós graduações; licenciado em Biologia e em História, tecnólogo em antropologia, jornalista, especializado em programação Python, Inteligência Artificial e tem formação profissional em Nutrição Clínica. Atualmente, é diretor do Centro de Pesquisas e Análises Heráclito; membro ativo da Redilat; chefe do Departamento de Ciências e Tecnologia da Logos University International, cientista no Hospital Martin Dockweiler, professor e investigador cientista na Universidad Santander de México, diretor da MF Press Global, membro da Sociedade Brasileira de Neurociências e da Society for Neuroscience, nos Estados Unidos; membro da Mensa International, Intertel e Triple Nine Society (TNS), associação e sociedades de pessoas de alto QI, esta última TNS, a mais restrita do mundo; especialista em estudos sobre comportamento humano e inteligência com mais de 130 estudos publicados.