Artes/cultura
21/12/2022 às 09:00•3 min de leitura
Há cerca de 10 mil anos, os primeiros humanos que andavam pela Terra, ainda no período Paleolítico, já viviam em cabanas simples e tendas, mas o abrigo mais característico de seu tempo foram as cavernas. Na Europa e no oeste da Ásia, esses ambientes cársticos também foram habitados por alguns Cro-Magnons há cerca de 35 mil anos e utilizados para construção de abrigos nas entradas e realização de cerimônias religiosas em seu interior escuro.
Essa hereditariedade histórica das cavernas fez delas muito mais que abrigos repletos de ciência, como o ramo da espeleologia estuda, mas também lugar de histórias antigas, mitos e lendas. Os povos Lakota, por exemplo, descreviam a humanidade emergindo das profundezas de uma caverna, enquanto a Teoria da Terra Oca basicamente reforça o fascínio das pessoas pelos locais profundos, escuros e internos da Terra.
Com 8.849 metros de altitude, o Everest é a montanha mais alta que encontramos, enquanto a Veryovkina é a caverna mais profunda do mundo – e também a mais perigosa.
(Fonte: National Geographic/Reprodução)
A entrada quase imperceptível da caverna, com seus 3 metros na superfície, localizada na paisagem verdejante de Abkházia, região separatista georgiana apoiada pela Rússia, nem parece que esconde impressionantes 2.212 metros de profundidade.
Não é para menos que a caverna nunca foi explorada de uma só vez, tendo a expedição Ramo Krasnoyarsk, de 1968, alcançando os 114 metros iniciais, o equivalente ao Empire State Building, sendo que isso é apenas 5% de toda a profundidade de Veryovkina. Demorou até 2018, na quinta expedição, para que os exploradores conseguissem tocar o fundo absoluto da caverna, onde há um poço que se estende em um lago subterrâneo apelidado de Lago Nemo – em referência ao protagonista do romance Vinte Mil Léguas Submarinas –, com mais 7 metros de profundidade.
(Fonte: 9Gag/Reprodução)
A expedição foi essencial para descobrir que Veryovkina se ramifica diversas vezes, tem seções horizontais e cheias de água, trechos íngremes e câmaras subterrâneas tão grandes que cabem 8 campos de futebol. A caverna é habitada por espécies raras de escorpiões, camarões, centopeias e outros insetos e animais que nunca foram vistos ou encontrados na superfície.
Apesar de essa descoberta natural essencial, a expedição também se mostrou uma das mais mortais já registradas na História, porque foi por pouco que os exploradores não voltaram.
(Fonte: BBC/Reprodução)
O fotógrafo Robbie Shone e seu assistente Jeff Wade se juntaram à equipe russa, liderada por Pavel Demidov, para documentar toda a descida na Veryovkina. Em setembro de 2018, após os exploradores terem alcançado o fundo da caverna em março daquele ano, eles voltaram para fazer uma análise mais detalhada do ambiente, de suas espécies e verificar algumas fendas que poderiam levar a passagens que não tivessem inspecionado.
O grupo demorou 4 dias para alcançar o fundo da caverna novamente e em uma manhã, enquanto tomavam café, Veryovkina começou a tremer como se um terremoto estivesse em curso. “A maior torrente de água que já vi na minha vida simplesmente jorrou de uma abertura”, compartilhou Shone ao National Geographic, acrescentando que nunca mais vai se esquecer do som que antecedeu o desastre que inundou a caverna.
(Fonte: Atlas Obscura/Reprodução)
Os espeleólogos chamam o que aconteceu de "pulso de inundação", quando a água da superfície – centenas de metros acima – escorre para dentro da caverna e a enche como um jarro. Isso significa que tudo se torna uma piscina em poucos minutos.
Shone teve que deixar todo seu equipamento para trás, carregando apenas os cartões de memória de sua câmera. A enchente durou 20 horas, enquanto eles se moviam em todas as direções para evitar que fossem encurralados em algum ponto ou acabassem afogados.
Muito embora nenhum membro da expedição tenha morrido, um mês antes da descida, o grupo entrou em contato com o Ministério de Emergências da Abkhazia para notificar uma corda pendurada na entrada de Veryovkina. Descendo alguns metros no interior cárstico, os agentes descobriram o cadáver de um homem desaparecido há 9 meses, e isso se tornou uma espécie de mau agouro para os espeleólogos, como se a caverna estivesse se preparando para fazer mais vítimas.