Artes/cultura
02/09/2022 às 12:00•3 min de leitura
“Diversidade, alegria, carnaval, futebol e muita gentileza” são as primeiras palavras que o filósofo Mário Sérgio Cortella responde em entrevista ao podcast jornalístico Sociedade em Foco, da Universidade de São Paulo (USP).
Ele falava diretamente de Abu Dhabi, capital dos Emirados Árabes, e sua resposta era sobre com o que os habitantes de lá costumam relacionar ao Brasil. Contudo, Cortella não deixa de ressaltar que, mais uma vez, esse é um pensamento que costuma ser não só generalista como também simplista – além de muito ingênuo, infelizmente.
Então qual é a visão que os estrangeiros tem do Brasil?
(Fonte: Exame/Reprodução)
Há anos essa pergunta tem sido alvo de ensaios, pesquisas e teses, porém o próprio curso da história brasileira, principalmente política, sempre mudou as respostas.
Prova disso é que uma pesquisa feita em 22 países pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT) e pelo Instituto Sensus, e citada pelo jornalista Gilberto Dimenstein em uma matéria para a Folha em janeiro de 2001, mostrou que 68,2% das pessoas consideravam o povo brasileiro alegre e hospitaleiro; 48,7% acreditavam que o povo era trabalhador e confiável; 37,5% deles enxergavam o Brasil como um lugar razoável para se viver.
Em 2016, um levantamento feito pela Expat Insider, em entrevista com 14.272 expatriados associados à rede InterNations, colocou o Brasil em 64º lugar no ranking dos melhores lugares para um estrangeiro viver (dos 67 países avaliados), perdendo apenas para a Nigéria, Grécia e Kuwait.
(Fonte: El País/Reprodução)
Refeito em 2019, entrevistando mais de 20 mil estrangeiros, dessa vez o Brasil caiu ainda mais nas expectativas, honrando o título “Sem festa para este país”, conquistado três anos antes. Um neozelandês relatou que existe um sentimento nas pessoas de sempre viverem com medo. Um alemão, por sua vez, disse que o alto nível de desigualdade e brutalidade na sociedade é "perturbador" e o deixava desconfortável. Para ele, o caos político causou muita confusão e problemas em seu local de trabalho.
E nada coincidentemente, a violência, insegurança e medo crônico que passaram a assolar a realidade dos brasileiros são um dos 3 fatores que motivam o maior êxodo da história do país, segundo um levantamento feito em 2021 pelo Ministério das Relações Exteriores.
(Fonte: ViajaNet/Reprodução)
No começo de 2020, foi publicado um artigo acadêmico na revista internacional Brasiliana intitulado "O Brasil não é (visto como) um país sério: uma avaliação das lacunas entre as imagens externas e a ambição internacional da nação", em que foi analisado as percepções sociais que os estrangeiros têm sobre o Brasil.
A pesquisa priorizou uma abordagem que não foca exatamente no atual cenário de percepção sobre o país, tampouco sobre a política externa brasileira após a eleição de Jair Bolsonaro à presidência em 2019, mas um viés histórico sobre a imagem do Brasil, mostrando que a frequente associação a uma nação de festas e diversão reforça a descrição de que "não é um país sério".
Nas principais pesquisas de reputação das nações pelo mundo, a opinião dos entrevistados pela Nation Brands Index foi de que o Brasil é considerado "decorativo, mas não exatamente útil"; e "atraente, mas não levado a sério pelos outros países". Foi concluído que a constante imagem de um país carnavalesco, de pessoas bonitas, hospitaleiras e tudo o mais, é uma fachada para uma economia pobre e sociedade muito desigual.
Entre os 10 mil entrevistados da Soft Power 30, foi feito um adendo de que, fora todos os problemas de cunho político e social, o Brasil é visto como um lugar de "performance moderada na categoria Cultura ao trazer o futebol, as artes, festivais gastronômicos e o carnaval para o mundo". A Good Country Index ressaltou que o Brasil poderia contribuir muito mais para o mundo, ser mais aberto e ter mais cooperação internacional em vários aspectos.
Apesar de a pesquisa não refletir o real potencial do país, tampouco servir para ser lida como uma verdade absoluta, é possível entender que o Brasil até tem uma percepção internacional positiva no geral, porém associada a ideia de férias e exotismo, como remonta suas raízes colonizadoras.
(Fonte: Notícias do Minuto/Reprodução)
Daniel Buarque, autor do estudo, reflete que, nesse caso, o problema é que isso estimula a falta de não enxergar o país como uma potência mundial política ou econômica emergente no mundo, como há anos tenta se provar em política externa.
Ou seja, a ideia de que o Brasil é uma das nações "mais legais do mundo" pode ser boa apenas no âmbito de marca nacional (nation branding), que é como o país se promove para o mundo, como um ótimo lugar para ser visitado, por exemplo. E que só ser legal não seja o suficiente para ser levado a sério, apesar de tudo.