Saúde/bem-estar
10/11/2024 às 03:00•4 min de leituraAtualizado em 10/11/2024 às 03:00
Segundo o último levantamento feito pelo centro de pesquisas Statista, a cocaína possui cerca de 22 milhões de usuários em todo o mundo, dos quais 4,77 milhões são dos Estados Unidos, onde estudos já comprovaram que 40,9 milhões de americanos usaram cocaína em algum momento de sua vida. Para se ter noção do tamanho do problema, em 2021, houve cerca de 24.486 mortes associadas ao uso de cocaína no país – ainda que estas também envolvessem o uso de outras drogas, como opioides.
Portanto, é de se esperar que o cultivo ilícito de cocaína seja imenso, responsável por cobrir cerca de 235 mil hectares, sendo a América do Sul a maior concentração da indústria. Desde meados de 2016 que países da Europa sofrem com a disseminação da cocaína por meio de portos marítimos, como parte da diversificação do mercado e dos produtores da droga, resultado do aumento da produção colombiana, transformando o continente em uma das redes criminosas mais eficientes do mundo.
Cerca de 3,5 milhões de europeus consumiram cocaína no último ano, conforme o último "Relatório Europeu sobre Drogas", publicado em 2023. Desses, 2,2 milhões eram jovens adultos com idades entre 15 e 34 anos.
O mercado ilícito de cocaína no Reino Unido, por exemplo, gera cerca de 4 bilhões de euros por ano para gangues criminosas, segundo relatório da Agência Nacional de Crime do Reino Unido. Consequentemente, o vício e o problema de saúde pública aumentaram, considerando que 35 milhões de pessoas no mundo sofrem de transtornos por uso de drogas e necessitam de serviços de tratamento, segundo o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC).
Para Daniel Deimel, pesquisador em dependência química, ficou claro que a cocaína é usada por muitas pessoas de classe média e é quase normalizada. Não é para menos que a indústria de substâncias ilícitas continua se reinventando, exemplo disso foi o surgimento da cocaína rosa, a perigosa droga que se tornou popular entre os jovens na Europa.
Em 16 de outubro, o mundo da música e do entretenimento se comoveu com a morte repentina de Liam Payne, o astro ex-vocalista da boyband inglesa One Direction, que movimentou o mundo da música pop de 2010 até 2016, se consagrando como um dos maiores grupos masculinos da geração.
O cantor faleceu ao cair da varanda de um hotel em Buenos Aires, Argentina, e, de acordo com fontes anônimas familiarizadas com relatórios toxicológicos iniciais, ele tinha várias drogas em seu organismo, incluindo crack e metanfetamina. A ABC News e a TMZ informaram que Payne deveria ter feito o uso de cocaína rosa, um coquetel de drogas contendo metanfetamina, cetamina e MDMA (ecstasy).
Normalmente, essa droga recreativa não inclui cocaína, apesar de especialistas perceberem que isso pode ir do gosto do usuário. O coquetel, composto por um corante alimentar com sabor e aroma de morango, geralmente contém pelo menos um medicamento estimulante e um depressor. Ou seja, metanfetamina, um tipo de estimulante cerebral; cetamina, um anestésico dissociativo com efeitos alucinógenos; e ecstasy, além de benzodiazepínicos (medicamentos hipnóticos e ansiolíticos), crack e cafeína.
A cocaína rosa se tornou popular nas baladas entre os jovens porque causa euforia, alucinações e experiências psicodélicas, incluindo o aprimoramento da percepção sensorial e mudanças de humor. Além de que, é claro, sua estética vibrante, em pó ou pílula, gera um apelo visual bem maior do que as demais drogas.
A cocaína rosa foi desenvolvida na Colômbia, com os primeiros registros das autoridades apontando para meados de 2010. Desde então, seu uso se espalhou pela cena noturna latino-americana, da Argentina ao Panamá, rapidamente se infiltrando entre o gosto popular dos clubbers nos EUA e na Europa a partir de 2022. Há ainda evidências que ganhou força na Escócia e em partes do País de Gales. Atualmente, a droga sintética gera preocupação para Espanha e o Reino Unido, onde sua popularidade saiu do controle.
Em setembro, as autoridades espanholas realizaram a maior apreensão de drogas sintéticas de todos os tempos, chegando a tirar de circulação cerca de um milhão de pílulas de ecstasy e também de cocaína rosa, durante uma operação em Ibiza e Málaga, onde se concentram as maiores redes de tráfico do país.
Não é por acaso que especialistas comparam o uso de cocaína rosa a jogar roleta-russa. A natureza dos efeitos do coquetel de substâncias está fortemente associada a um número crescente de mortes. É uma substância de fácil overdose e seu uso a longo prazo pode causar ataques cardíacos, pressão alta, aumento do risco de AVC; bem como alterações comportamentais, dependência química, ansiedade persistente, depressão e psicose. Por essa e tantas outras razões que organizações europeias estão apelando para ações urgentes para lidar com os riscos que essa droga representa.
A substância é difícil de detectar por meio de testes de drogas padrão, principalmente na Espanha, onde o regime de testes atual ainda não está equipado para identificar todos os seus componentes. A princípio, as autoridades esperavam que o preço da droga, em média US$ 100 por grama e por volta de 76 euros na Espanha, fosse segurar sua proliferação, mas não foi bem isso que aconteceu. Na verdade, surgiu um problema até maior: o coquetel de cocaína rosa passou a ser distribuído com substâncias aleatórias, piorando as consequências dos seus efeitos.
"Em muitos aspectos, a cocaína rosa é um exemplo do marketing mais sofisticado de substâncias sintéticas para os consumidores, que provavelmente têm pouca compreensão de quais produtos químicos estão realmente consumindo", disse a Agência de Drogas da União Europeia, em um comunicado.
A popularidade da cocaína rosa é um lembrete de como a indústria de drogas ilícitas não para de se reinventar, usando e abusando das redes sociais e das peças de propaganda de entretenimento para saber o que mais atrai os jovens.