Ciência
20/11/2022 às 12:00•4 min de leitura
Apesar de a biometria estar atualmente associada à tecnologia para preservar a segurança, o uso da impressão digital surgiu em meados do século XIX com a necessidade de exploração da possibilidade de melhor identificar uma pessoa em situações legais ou forenses.
Esse tipo de identificação foi a porta de entrada para que a tecnologia percebesse que as digitais não são a única parte do corpo que pode ser medida, alcançando métodos revolucionários como o rastreamento biológico complexo – muito útil para solucionar crimes ao determinar as características de um indivíduo –, os scanners de íris e o reconhecimento facial, ambos populares já no século XXI.
No entanto, como acontece com todo avanço controverso, a popularização da impressão digital culminou em inconsistências no armazenamento de dados, e seu compartilhamento acidental, também associado ao controle governamental sobre os cidadãos, cercado por preconceito em um sistema considerado até opressor.
(Fonte: University of North Florida/Reprodução)
O código mais marcante da humanidade são as impressões digitais, estampadas em cavernas pelo homem Neandertal, que viveu durante o Pleistoceno Médio na Europa e no Oriente Médio, na Península Ibérica, há cerca de 400 mil anos, e extintos há 28 mil anos.
Uma das primeiras digitais encontradas foi um traçado petraglyph de uma mão, encontrado no lago Kejimkujik, na Nova Escócia, e em esculturas neolíticas em Gavrinis, na França. Na Babilônia, os povos já usavam sua digital como meio de assinar contratos, pressionando os dedos em tábuas de argila e gravando a superfície de documentos, reforçando uma prática que prevalece até hoje.
Por volta de 1792 a.C., a impressão foi usada pela primeira vez para identificação de criminosos, durante a época Hamurábi, onde funcionários do Estado coletavam as impressões daqueles que prenderam. Historiadores concluíram que também foram usadas como prova em casos criminais, pois apareceram em um documento de julgamento que remonta o período de 300 a.C.
(Fonte: National Gallery of Canada/Reprodução)
Em 1870, o criminologista francês Alphonse Bertillon fundou o primeiro laboratório de identificação criminal com base em medidas do corpo humano, criando o campo da antropometria judicial que, embora não usasse impressões digitais, contribuiu essencialmente para determinar o futuro dos sistemas de classificação de identidade a partir da década de 1970 – até quando seu sistema Bertillon foi utilizado na Europa e Estados Unidos.
O método do francês se baseava na combinação do então crescente uso da fotografia com medidas detalhadas do corpo, documentados em cartões que poderiam ser pesquisados pelas autoridades, por exemplo. Neles, constavam a largura da cabeça, a distância entre o cotovelo e a extremidade do dedo médio.
Quando sua complexidade e excesso de margens de erros começaram a ficar aparentes demais, o uso das impressões digitais como método mais simples e eficaz assumiu o comando, dando início a uma era que mudou tudo.
Henry Faulds. (Fonte: Fingerprinting Scottsdale/Reprodução)
Com a turba de pessoas que invadiram as cidades durante a Revolução Industrial de 1800, veio o anonimato urbano se infiltrando na sociedade, afetando a polícia na hora de identificar as pessoas, fazendo do método Bertillon um desafio maior do que já era.
As impressões digitais não eram novidade naquela época, mas a ideia de que pudessem ajudar a identificar estranhos em grande quantidade, sim. O médico escocês Henry Faulds foi um dos nomes que exploraram essa ideia, sobretudo depois de implementar a identificação por meio de impressões digitais após descobrir impressões em antigas cerâmicas japonesas, usando a técnica com seus colegas de trabalho.
Ao mergulhar dedos na tinta e pressioná-los no papel, Faulds notou que o padrão contido em cada dedo não era o mesmo. Com isso, ele realizou vários julgamentos para testar sua teoria sobre o uso das impressões em casos criminais, chegando a resolver um pequeno crime – quando solucionou quem estava roubando álcool do hospital ao comparar as impressões digitais deixadas na garrafa com uma que havia coletado de um colega de trabalho.
Em 1880, Faulds publicou um trabalho de pesquisa na Nature explicando suas descobertas e seu valor para identificação criminal.
Francis Galton. (Fonte: Hulton Archive/Getty Images)
Faulds relatou a Charles Darwin, que não se mostrou interessado, e repassou ao antropólogo britânico Francis Galton que, apesar de ter se apropriado da ideia e não ter dado nenhum crédito, contribuiu com detalhes de sua pesquisa, mostrando que os padrões e linhas do topo de um dedo deveriam ser usados ao comparar impressões para identificação.
Ao publicar seu livro Finger Prints, em 1892, Galton inspirou Edward Henry, chefe de polícia em Bengala, na Índia, a não só incorporar impressões digitais no protocolo de identificação em seu trabalho, como também desenvolver o Sistema de Classificação Henry.
Criado em 1896, o método revolucionário era uma maneira mais fácil de identificar pessoas e também a solução para o problema da falta de agrupamentos primários que simplificassem o processo de busca. O sistema tinha como base a atribuição de valores numéricos a 10 dedos e apenas na adição dos números onde apareceu um padrão de espiral. O resultado foi 1.024 grupos primários para pesquisa.
(Fonte: enot-poloskun/Getty Images)
O Federal Bureau of Prisons, em Nova York, foi a primeira agência norte-americana a adotar impressões digitais para identificação. Em 1906, a Lei dos EUA já usava o Sistema Henry, com o FBI estabelecendo o Departamento da Divisão de Identificação em meados de 1924, a fim de servir como banco de dados central de registros de identificação criminal.
Da mesma forma que a técnica de Bertillon caiu com o boom da Revolução Industrial, o mesmo aconteceu na primeira metade do século XX, com o número crescente de registros de impressões e a necessidade de uma maneira de classificação mais fácil.
(Fonte: The Conversation/Reprodução)
A ideia de automação do recurso foi a saída, com os computadores entrando como força de trabalho em 1967, constituindo o primeiro banco de dados criminal digital nacional, o National Crime Information Center (NCIC). A classificação NCIC acelerou o processo de pesquisa, mas ainda não conseguia identificar uma impressão, tampouco coletá-la digitalmente, o que só aconteceu em 1972 com o primeiro leitor automático de impressões digitais instalado em Washington, fazendo nascer o Sistema de Identificação Automatizada.
O século XXI chegou para a fazer acontecer a transição dos mapas matemáticos das pequenas características e padrões da impressão para os perfis de DNA, responsáveis por revelarem bem mais sobre o indivíduo do que apenas sua identidade – o que é um problema.