Artes/cultura
07/10/2022 às 13:00•2 min de leitura
No final do período do Renascimento, havia uma prática relativamente comum da venda de ossos como relíquias. Os esqueletos eram divididos em pedaços e vendidos para vários compradores. E há um mistério em torno do comércio do crânio de René Descartes, o famoso filósofo francês.
Aparentemente, era meio normal que uma pessoa rica tivesse um pedaço do corpo de um famoso em sua sala. “A história nos mostrou o comércio de restos humanos de pessoas famosas, que era comum abrir um caixão e roubar um osso e depois vendê-lo”, diz Per Karsten, diretor do Museu Histórico da Universidade de Lund, na Suécia.
(Fonte: Brain Tour)
O ritual da "explosão do crânio" (no original, skull blasting) era bastante comum nos primórdios da medicina. Usava-se um método para desarticular os ossos do crânio a partir da implantação de sementes, como feijão, lentilha e amendoim. Mais tarde, o cirurgião francês Edmé François Chauvot de Beauchêne inventou, no século XIX, uma nova técnica que visava separar os 22 ossos do crânio para facilitar o estudo.
Contudo, os ladrões de túmulos não estavam muito interessados em como fariam para separar esses ossos para vender. Para completar, os crânios tinham uma importância particular para estes comerciantes — afinal, além de serem visualmente atraentes, as caveiras representavam a própria identidade e até o espírito de uma pessoa. E talvez poucos crânios fossem tão visados pela elite como o desse homem: René Descartes, uma das mentes mais admiradas de sua época.
(Fonte: Grosvenor Gallery)
Em 1650, Descartes havia viajado para a Suécia, a convite da rainha Cristina, para apresentar suas ideias para a Corte. Ocorre que, algumas semanas depois de chegar lá, o filósofo sentiu uma dor no peito, que era sintoma de pneumonia. Ignorando o conselho dos médicos, ele tentou curar a doença com uma infusão de tabaco e tomando bebidas alcoólicas.
Não deu certo: em poucas semanas o pensador morreu e seu corpo foi enterrado na Suécia, onde permaneceria por 16 anos. Em 1666, o cadáver foi exumado e levado para a igreja Saint-Geneviève-du-Mont, em Paris. Entretanto, o caixão foi reaberto em 1818 e notou-se que faltava o seu crânio.
Um homem chamado Jöns Jakob Berzelius declarou que, na Suécia, soube de um crânio que teria supostamente sido de Descartes, sendo vendido em um leilão para um magnata. Berzelius conseguiu convencer o homem a devolver o crânio para a França.
Mas logo levantou-se uma nova polêmica que aquele crânio não seria mesmo do filósofo. Esta afirmativa foi levantada por pesquisadores da Universidade de Lund, que questionaram a autenticidade da peça.
(Fonte: Atlas Obscura)
As provas desta farsa eram as seguintes: o crânio em questão (que estava partido em seis partes) tinha uma inscrição que assegurava que ele havia pertencido a Descartes, e carregava o nome de seis proprietários suecos. Ocorre que havia problemas em pelo menos quatro desses nomes.
Os pedaços de osso desse crânio logo foram analisados e rastreados em sua origem. Alguns excertos foram considerados falsos, enquanto outros foram tidos como genuínos. Outros elementos foram contestados, como as "suturas" entre as partes da caveira, que não se encaixariam.
Dentro de uma parte do osso parietal, está escrito em sueco “o crânio de Descartes, 1691, número 6”. Daí se conclui que provavelmente foi no ano de 1691 que as calotas cranianas de Descartes foram "explodidas" e seus pedaços foram separados para serem vendidos. Mas não se sabe com total certeza quantos dos trechos achados são verdadeiros.
Por isso, não se sabe ao certo se há outros pedaços da cabeça de Descartes ainda circulando pela Suécia, ou se estão todos enterrados em sua cidade natal, Paris.