Artes/cultura
20/01/2022 às 12:00•3 min de leitura
Já imaginou estar andando tranquilamente por um vasto campo gramado durante a noite e, de repente, vislumbrar um grupo de caçadores selvagens fantasmagóricos liderados por um cavaleiro igualmente assustador? Essa é a visão de quem relata ter visto a procissão da Caçada Selvagem — em inglês, Wild Hunt —, uma história mitológica contada há muitas décadas em muitos lugares.
Assim como muitas outras crenças folclóricas, a Caçada Selvagem é recheada de mistérios, histórias de origem e figuras mitológicas assustadoras. Mas afinal, o que está por trás desse mito? Existe alguma parte verdadeira no conto?
Esse mito europeu descreve um grupo de cavaleiros como presságio de destruição.
Antes de entendermos a origem desse mito, vamos conhecê-lo um pouco melhor.
A Caçada Selvagem é uma antiga crença folclórica europeia que descreve um grupo de cavaleiros espectrais e fantasmagóricos que saem para caçar durante a noite. O mito conta que eles cavalgam pelos céus ou pela terra acompanhados de pássaros carniceiros, cães de caça selvagens, valquírias, elfos da noite e outras criaturas assustadoras.
Os relatos contam que essa visão é um presságio para catástrofes, geralmente acontecendo antes de períodos de batalhas sangrentas e guerras entre reinos, pragas e fome. Além disso, aquele que testemunhasse a presença dos cavaleiros certamente morreria.
Algumas tradições também afirmam que aqueles que veem a Caçada Selvagem são abduzidos pelos cavaleiros. Essas vítimas seriam arrastadas para um reino de fadas fantasmagóricas ou se veriam forçados a se juntarem à cavalaria na caçada eterna.
Também é importante destacar que o líder da Caçada Selvagem sempre é algum personagem de renome. Odin — o deus supremo de Asgard — é a figura mais comum, mas variações desse mito mencionam outros deuses, heróis mitológicos e até o diabo como um dos cavaleiros principais do grupo.
Jacob Grimm, escritor do século XIX, foi um dos maiores responsáveis pela propagação desse mito.
Como diversas histórias mitológicas, é praticamente impossível precisar a origem de sua propagação. As Crônicas Anglo-Saxônicas, um dos registros escritos mais antigos dos anglo-saxões, menciona a Caçada Selvagem no ano de 1127. Em 1673, Johannes Scheffer no livro Lapponia reconta esse mito com algumas variações, mas apresentando novamente os elementos principais dessa história.
O relato de Hélène Adeline Guerber (1859-1929), de 1895, também menciona Odin liderando uma cavalaria de mortos que traziam tempestades e maus presságios por onde passava.
Porém, o conto que ajudou a popularizar de vez esse mito foi criado em 1835 por Jacob Grimm (1785-1863). O chamado Deutsche Mythologie mistura os elementos do folclore com evidências textuais de relatos medievais e alguns da era moderna. Esse compilado ganhou muita popularidade nos anos seguintes, atravessando as décadas e chegando até mesmo aos dias atuais como um renomado conto europeu.
Alguns criticam o método de Jacob Grimm ao misturar tantas fontes folclóricas e históricas para a criação desse mito. Contudo, o seu trabalho foi tão significativo que até hoje a Caçada Selvagem é conhecida em diversas partes da Europa como um mito muito popular.
A Caçada Selvagem tem algumas variações em sua história dependendo do país em que é relatada.
Por se tratar de uma crença folclórica da Europa, é natural pensar que a história da Caçada Selvagem tenha variações em alguns países. Confira as diferenças desses mitos em diferentes regiões:
Na França, esse mito é conhecido como Mesnée d'Hellequin (francês antigo que significa “família de Hellequin”). Os franceses provavelmente adotaram a Caçada Selvagem dos normandos, povo germânico estabelecido no norte do país.
No conto francês, o grupo de cavaleiros é liderado por Hellequin, um emissário mascarado enviado pelo diabo diretamente do inferno. O seu objetivo é recrutar novos integrantes para a caçada, além de levar destruição por onde passa.
Na variação alemã desse mito, a Caçada Selvagem é liderada pelo deus Wotan, uma das principais divindades do panteão anglo-saxônico — uma espécie de equivalente ao Odin nórdico. O grupo também é acompanhado de lobisomens e monstros que não aparecem em outros mitos.
Em vez de simplesmente atacar outras pessoas, a caçada alemã roubava comida e cerveja das casas que invadia. Porém, jovens donzelas ainda representa um alvo para os cavaleiros fantasmas desse conto.
O relato inglês da Caçada Selvagem tem até mesmo monges como testemunhas que relatam ter visto os cavaleiros indo da cidade de Peterborough até Stamford durante um período de nove semanas. O grupo seria composto de cerca de 30 espectros enormes cavalgando cavalos pretos e até cabras.
Nos países da Escandinávia, a caçada é geralmente liderada por Odin, mas raramente vista por seres humanos. A passagem do grupo poderia ser reconhecida pelo latido dos cães que acompanham os cavaleiros e a recomendação era se abaixar para não ser atropelado pela matilha e os cavalos que passariam em seguida.