Artes/cultura
28/10/2022 às 12:00•2 min de leitura
Por mais estranho que possa parecer, algumas obras de arte podem ter sua origem afastada dos artistas que a fizeram. Por diversos motivos, um filme, uma música, uma escultura ou um quadro podem ser atribuídos a "artistas desconhecidos", por não saber quem foi a pessoa responsável pelo trabalho.
Foi isso que aconteceu com um quadro chamado de O Homem Sentado. Essa misteriosa pintura de um homem negro de perfil, usando um chapéu de palha, uma camisa branca rasgada e sentado em frente a uma paisagem, não tinha origem conhecida.
Na parte inferior do retrato, há uma assinatura que por muito tempo intrigou os historiadores da arte: B-E-R-T-H-E. O nome não constava em nenhum índice do National Trust UK, a maior instituição de caridade de conservação da Europa. Isso fez com que as identidades do homem na pintura e do artista permanecessem um mistério — até agora.
Richmond Barthé. (Fonte: Wikimedia Commons)
Em 2020, Alice Rylance-Watson, curadora do National Trust UK, estava trabalhando na catalogação de obras criadas por e para pessoas marginalizadas, quando esse retrato atraiu sua atenção em um catálogo online. Ela foi até o local onde o quadro estava e percebeu que havia um erro de digitação no catálogo.
A segunda letra do nome do artista era, na verdade, um "A" e não um "E", como estava no catálogo. Com essa nova informação, Rylance-Watson conseguiu rastrear a obra até o seu criador: Richmond Barthé.
Nascido em Bay St. Louis, Mississippi, Barthé é mais conhecido como escultor, embora tenha ido para a escola de arte com a intenção de estudar pintura. Ele foi um dos poucos artistas afro-americanos reconhecidos pelo mundo da arte dominante durante sua vida. Margaret Rose Vendryes, historiadora da arte e autora da biografia de Barthé, considerava estranho que tão pouco se soubesse sobre ele hoje.
De acordo com a equipe de curadores do NT UK, o retrato foi criado na década de 1950. Nessa época, Barthé estava morando na Jamaica tentando recomeçar sua vida artística. Ele havia morado em Nova York por 20 anos e era um escultor relativamente conhecido, mas pretendia se concentrar na pintura. No entanto, as pinturas de Barthé não trouxeram o mesmo sucesso comercial que suas esculturas e ele acabou doando ou destruindo a maioria delas.
(Fonte: National Trust UK)
Depois de descobrir o autor, também foi possível saber quem era o homem na pintura de Barthé. Rylance-Watson analisou diversas fotografias publicadas no livro de Vendryes, da época em que ele esteve na Jamaica. Foi assim que ela descobriu que o modelo era Lucien Levers, um empregado de Barthé na ilha caribenha.
“Ficou muito claro que não poderia ser mais ninguém além de Lucien Levers, porque ele tem uma protuberância muito pronunciada no topo da ponte do nariz, e eu vi isso completamente reproduzido na pintura”, explicou Rylance-Watson.
E como O Homem Sentado foi parar na Inglaterra? Rylance-Watson acredita que Barthé possa ter doado para Peregrine Cust, um inglês descendente da família que construiu a mansão onde a pintura foi encontrada. Essa conexão é sustentada pelo fato de o estúdio de Barthé ficar próximo da casa de férias de Cust na Jamaica, e por haver um memorial em mármore com um retrato em bronze da sua segunda esposa, também assinado por Barthé, no terreno da mansão.