Ciência
08/12/2024 às 18:00•2 min de leituraAtualizado em 08/12/2024 às 18:00
Uma peça de madeira de cedro, adornada com centenas de fragmentos de turquesa e detalhes em madrepérola, ouro e conchas, carrega séculos de história, mistério e poder. Assim é a Máscara de Xiuhtecuhtli, uma obra-prima da arte asteca, que atravessou o tempo para se tornar um dos objetos mais fascinantes do Museu Britânico, em Londres.
Criada entre os anos 1400 e 1521, ela foi provavelmente levada da Mesoamérica para a Europa por Hernán Cortés, como parte dos tesouros tomados do Império Asteca e oferecidos ao rei Carlos V.
Xiuhtecuhtli, cujo nome significa "senhor turquesa" na língua náuatle, era o deus do fogo e da renovação no panteão asteca. Esse simbolismo fica evidente na máscara, que incorpora elementos associados à transformação. As tesselas de turquesa mais escuras criam um desenho de borboleta, um poderoso emblema de mudança e continuidade para os astecas.
Mas o propósito da máscara vai além da estética: acredita-se que ela era usada em cerimônias religiosas grandiosas, como a Xiuhtlalpilli, ou Cerimônia do Novo Fogo, realizada a cada 52 anos. Esse ritual marcava a renovação do ciclo asteca, quando o fogo sagrado era extinto e reacendido no peito de uma vítima sacrificial, garantindo a continuidade do cosmos.
A máscara, que mede cerca de 16,8 centímetros de altura, foi projetada com intrincada atenção aos detalhes. A madeira era curvada para reproduzir os contornos faciais, e os mosaicos de turquesa eram habilmente colados com resina de pinho, conferindo profundidade e realismo ao objeto.
Os olhos foram feitos de madrepérola, com bordas originalmente douradas, enquanto os dentes, confeccionados de concha, destacam-se pelo brilho. No interior, a máscara é pintada com cinábrio, um pigmento vermelho-tijolo que contém mercúrio, talvez representando o elemento vital do fogo.
Embora geralmente associada a Xiuhtecuhtli, a identidade da máscara é alvo de debates. Alguns estudiosos sugerem que o mosaico elevado pode representar o deus Nanahuatzin, que, segundo a mitologia asteca, sacrificou-se no fogo para se tornar Tonatiuh, o sol da era atual. Esse entrelaçamento de simbolismos reflete a complexidade da cultura asteca, onde deuses e rituais se mesclam em narrativas de transformação e sacrifício.
O fato é que a máscara em si é um testemunho do talento técnico e artístico dos astecas. O uso de diferentes tons de azul para destacar bochechas, nariz e queixo, além de uma borboleta estilizada formada pelas tesselas mais escuras, conecta o objeto ao simbolismo da transformação e da renovação, temas centrais da mitologia asteca.
Hoje, a Máscara de Xiuhtecuhtli é um testemunho da rica herança asteca e das tensões culturais desencadeadas pela conquista espanhola. Seu brilho turquesa ainda evoca a chama do "novo fogo", um lembrete da força vital que os astecas buscavam perpetuar.
Embora não possamos mais ouvir as orações entoadas ou sentir o calor do fogo sagrado que ela presenciou, a máscara continua a nos contar histórias, oferecendo um vislumbre da espiritualidade e do esplendor artístico de uma civilização que, mesmo em ruínas, permanece inesquecível.