O estranho caso de um homem que não consegue ver os números de 2 a 9

26/06/2020 às 11:003 min de leitura

Cientistas da Universidade Johns Hopkins publicaram na última segunda-feira (22) um estudo na revista eletrônica Proceedings of the National Academy of Sciences no qual relatam a estranha incapacidade de um homem para enxergar os números básicos de 2 a 9. 

Identificado apenas como RFS, o homem, que é engenheiro geólogo, foi diagnosticado com uma doença cerebral degenerativa rara chamada síndrome corticobasal no ano de 2011. No entanto, a incapacidade absoluta de enxergas dígitos númericos pode, afirmam os pesquisadores, fornecer algumas pistas preciosas sobre o funcionamento do cérebro.

Depois de estudar a evolução da doença, que teve início com queixas de dor de cabeça e perda de memória no final de 2010, os pesquisadores concluíram que uma resposta cerebral firme a um estímulo (como um rosto ou uma palavra) não significa que o indivíduo esteja consciente disso. 

Conforme o artigo, a rara síndrome tende a afetar pessoas mais velhas (RFS tinha mais de 60 anos) e os principais sintomas apresentados são: espasmos musculares, incapacidade de mover os membros e alguns problemas sensoriais que se agravam com o passar do tempo.

Números são espaguetes

Além desses sintomas, o paciente passou a relatar aos neuropsicólogos que o atenderam na Johns Hopkins de Maryland que ele não conseguia de jeito nenhum enxergar os números de 2 a 9 e nem imagens ou palavras onde estes dígitos estivessem incorporados. 

Quando desafiado a olhar para os referidos números, tudo o que RFS via eram linhas pretas rabiscadas. Se estes dígitos estivessem impressos em um papel colorido, a cor se tornava plano de fundo e, quando ele desviava o olhar e voltava, as linhas mudavam de forma, tornando impossível a dedução dos números. 

Apesar disso, os resultado da eletroencefalografia (EEG) mostraram que o cérebro do engenheiro foi capaz de identificar de forma correta tanto as imagens como as palavras, embora ele não estivesse consciente disso. 

Após analisar os exames da atividade elétrica do cérebro de RFS -- que faz com que ele veja formas parecidas com espaguetes no lugar dos números 2 a 9 -- os cientistas concluíram que o cérebro humano consegue reconhecer conceitos complexos, como números, antes mesmo de estarmos conscientes sobre eles.

Para um dos autores do artigo, o professor Michael McCloskey, do Departamento de Ciências Cognitivas, "quando ele olha para um dígito, seu cérebro precisa 'ver' que é um dígito antes que ele não possa vê-lo - é um verdadeiro paradoxo. Neste artigo, o que fizemos foi tentar investigar o processamento que estava acontecendo fora de sua consciência".

O funcionamento cerebral

Segundo McCloskey, o problema “é que ele é muito bom com números. É engenheiro e usa números em seu trabalho o tempo todo. E ainda consegue fazer contas e ainda sabe o que são números e entende o que eles são”. Exceto quando olha para números como 8 ou 3. Aí é total espaguete, como ele mesmo define.  

Para que RFS pudesse continuar trabalhando até a sua aposentadoria, os cientistas da Johns Hopkins criaram um sistema alternativo de números com base no dígito "1" e em várias letras. McCloskey explicou que isso foi possível pois o homem continuou lendo normalmente os números 0 e 1, bem como os algarismos romanos.

Outro fato que intrigou os pesquisadores foi que muitas letras se assemelham aos dígitos verificados entre 2 e 9, como o 8 e o B maiúsculo. No entanto, o engenheiro não teve nenhum problema em reconhecer letras, embora relatasse alguma distorção nas letras M, N, P, R, S e Z, mas não a ponto de não as identificar. 

https://www.youtube.com/watch?time_continue=1&v=ZNfSgzBrvwc&feature=emb_logo

Ainda segundo McCloskey, existem algumas partes do cérebro que "acendem" quando vemos rostos durante o exame. Os cientistas constataram que essas partes do cérebro de RFS se acendiam normalmente. Mas, quando ele olhava para números embutidos em palavras, outras partes diferentes eram ativadas. 

Coautor do estudo, David Rothlein do Laboratório de Atenção e Aprendizagem de Boston reconhece que “ele não tem ideia de que tem qualquer tipo de palavra ou qualquer tipo de rosto [no que eles mostram]. No entanto, parece que seu cérebro não está apenas ciente de que há algo lá como também está fazendo muitas análises complicadas”. 

Embora sofresse de condição muito incômoda, o desprendimento heróico de RFS em ser estudado e analisado foi fundamental para que os cientistas obtivessem informações preciosas sobre o funcionamento cerebral.

Porém, revela McCloskey, a expectativa média de vida de um indivíduo com a síndrome corticobasal é de oito a dez anos após o diagnóstico inicial. E, embora RFS esteja com suas funções cognitivas praticamente intactas, a sua saúde está bem debilitada. 

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