Ciência
03/08/2021 às 03:00•3 min de leitura
A cirurgia é um procedimento complexo e que pode durar horas. Para que tudo ocorra bem, além da preparação do médico, é importante que o paciente fique sedado, para, primeiramente, não sentir dor e para possibilitar que os profissionais façam as intervenções necessárias sem nenhuma intercorrência.
Assim, a anestesia é um procedimento que visa bloquear temporariamente a capacidade do cérebro de reconhecer um estímulo doloroso. Graças a essa invenção, os médicos podem realizar procedimentos invasivos sem que o paciente sinta dor. Mas até que a anestesia fosse criada, como os médicos realizavam as cirurgias?
Até que a primeira anestesia efetiva fosse criada, todas as cirurgias, das maiores às menores, eram extremamente radicais e poderiam ser comparadas à tortura. Os procedimentos realizados antes de 1846, quando o uso do éter foi descoberto como uma fonte eficiente para apagar os pacientes, as pessoas permaneciam acordadas ou inebriadas com outras substâncias que não eram tão efetivas.
Muitas vezes, era necessário que as pessoas permanecessem na sala com o objetivo exclusivo de segurar os pacientes, mesmo que eles gritassem, chorassem e implorassem para que o procedimento acabasse.
Demonstração pública em 1846 do uso do éter em uma cirurgia no Hospital Geral de Massachusetts. (Fonte: Brasil Escola/Reprodução)
Embora a descoberta fosse uma revolução para a medicina, apenas anos mais tarde a anestesia se tornou norma. Como a descoberta do uso do éter era algo novo e desconhecido, os erros de dosagem que faziam os pacientes acordarem no meio da cirurgia ou morrerem de overdose, fez com que os hospitais proibissem o uso da substância nas cirurgias. Médicos e dentistas de prestígio publicaram artigos condenando o uso e referindo-se à droga como "influência satânica".
Até que opções mais eficientes fossem encontradas, os médicos utilizaram o álcool como sedativo, fazendo com que os pacientes ficassem bêbados e dormissem para começar a operação. O problema é que isso durava pouco tempo, portanto, os médicos realizavam operações curtas nesses casos, como amputações, redução de fraturas, retirada de cálculo renal e circuncisão. Cirurgias do abdômen, por exemplo, eram inviáveis, pois os músculos precisavam estar relaxados e com extrema dor era impossível fazer o paciente relaxar.
Na realização das cirurgias também foram utilizadas drogas como Laudanum, que era um tipo de ópio, clorofórmio e alcaloides retirados de plantas, como Solanum e outras ervas que tentavam controlar a consciência e a dor durante as cirurgias. Essas tentativas eram comuns na cultura ocidental.
Na China, por exemplo, os médicos utilizavam a acupuntura para controle da dor, na ausência da anestesia. Outro ponto a ser destacado é que além da falta de anestesia, antes de 1940, quando os antibióticos foram isolados e administrados aos pacientes, havia um enorme risco de o operado morrer de infecção pós-cirurgia.
Até esse momento, os médicos não entendiam a importância de lavar as mãos e os instrumentos antes da cirurgia e mesmo com o paciente sedado, a infecção ocorria e, grande parte, dos operados morriam de septicemia. Por isso, os médicos avaliavam se os riscos de morrer sem a cirurgia eram maiores que morrer em decorrência dela.
A aceitação plena só ocorreu quando a teoria dos germes foi comprovada, diminuindo as taxas de mortalidade pós-operatória e quando a Food and Drug Administration foi criada, trazendo nova legislação e padrões farmacêuticos para a administração de medicamentos na hora das cirurgias.
Felizmente, as anestesias se desenvolveram e, atualmente, é possível realizar uma cirurgia complexa e que dure horas, sem o paciente acordar ou sentir dor. As opções disponíveis hoje são anestesia geral, regional ou local e utilizam coquetéis de drogas para inibir os sinais de dor.
A anestesia geral é indicada para cirurgias complexas e de grande porte, quando anestesias locais não são suficientes, ou seja, o tipo de anestesia necessária para bloquear a dor de um corte na pele é totalmente diferente de uma anestesia capaz de bloquear a dor da retirada de um tumor do abdômen.
Atualmente, as anestesias são escolhidas conforme a gravidade da operação e o tempo que o procedimento deve durar. (Fonte: Freepik/Reprodução)
A anestesia regional é utilizada em procedimentos mais simples, em que o paciente pode permanecer acordado. A anestesia bloqueia a dor em determinada região do corpo, como braço, perna ou toda região inferior. Ela se divide em anestesia raquidiana e anestesia peridural.
A raquidiana é inserida nas costas e aplicada na membrana dura-máter, que envolve a medula. Esse anestésico dentro da coluna espinhal bloqueia os nervos que passam pela coluna lombar, fazendo com que estímulos dolorosos vindos dos membros inferiores e do abdômen não consigam chegar ao cérebro.
Já a anestesia peridural é injetada na região peridural, que fica ao redor do canal espinhal. Diferentemente da raquidiana, que é colocada com agulha, a peridural é injetada com um cateter que fica administrando constantemente a medicação. Essa opção é utilizada no parto normal, por exemplo.
Por fim, existe a anestesia local, que é utilizada para bloquear dor em pequenas regiões do corpo feita com injeção de lidocaína na pele e nos tecidos subcutâneos. A anestesia local também pode ser feita por meio de gel ou spray, como no caso de endoscopias digestivas e impede que os receptores de dor na pele e nervos mais superficiais enviem sinais dolorosos ao cérebro.